sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Roma: Da Monarquia a República 31 a.C



A cidade-estado de ROMA, localizada na Península Itálica, no continente europeu, deu origem, na Antiguidade, à civilização e ao Império Romano, o qual abrangeu vastos territórios em torno do Mar Mediterrâneo.

ASPECTOS GEOGRÁFICOS E DE POVOAMENTO

A península Itálica, cujo território é limitado, ao norte, pela cadeia de montanhas dos Alpes, a leste, pelo Mar Adriático, a oeste pelo Mar Tirreno e ao sul, pela ilha da Sicília, era habitada por ligúrios e iberos, ligados aos habitantes da Gália e da Espanha, e por iapígios, vindos da Ilíria, do outro lado do Mar Adriático.
Por volta de 2 200 a 2 000 a.C., clãs indo-europeus denominados italiotas, atingiram a Itália pelo norte, trazendo armas e utensílios de ferro; fundiram-se com os antigos hbitantes e ocuparam uma região após outra até o sul. Dividiram-se gradualmente em três grupos que falavam dialetos diferentes da mesma língua: os úmbrios, ao norte e parte do centro; os latinos, na margem esquerda e curso inferior do vale do rio Tibre e os samitas, nos montes e vales ao sul da península.
Em princípios do 1º milênio a.C., a região do litoral do Mar Tirreno, entre os rios Tibre e Arno, foi conquistada pelos etruscos(invasores vindos da Ásia Menor) que aí se estabeleceram e penetraram pelo interior até o vale do rio Pó, ao norte da península.
Os etruscos cultivavam o solo, criavam o gado, exploraram as minas de cobre e ferro da região, produziam objetos de metal e tecidos e desenvolviam um amplo comércio com as colônias gregas ao sul da Itália e com a colônia fenícia de Cartago, ao norte da África. Criaram uma civilização urbana avançada, cujo apogeu data aproximadamente de 720 a 300 a.C.. As principais cidades da Etrúria formavam uma confederação, em que se destacavam Vulci, Vetulônia,. Populônia, Volsini, Clusiun, Veios, Arezzo, etc.
Do século VIII ao VI a.C., todo o litoral sul, da Campânia a oeste, passando pela Sicília, até a Apúlia a leste, foi ocupado pelos gregos cuja colonização deu origem às cidades de Siracusa, Tarento, Nápoles, Síbares, Crotona, Megara, etc.
A expansão etrusca em direção ao sul foi detida pela oposição dos gregos de Tarento e Nápoles, pelos samnitas e pelos latinos, habitantes do Lácio, na margem esquerda do rio Tibre.
Os últimos invasores da península foram os celtas ou gauleses, que, vindos da França, desalojaram os etruscos do vale do rio Pó(século V a.C.) e aí se estabeleceram. A região passou a ser chamada de Gália Cisalpina.

AS ORIGENS DE ROMA – A MONARQUIA (753 a 509 a.C.)

Por volta do século VIII a.C., havia numerosas aldeias de agricultores e pastores latinos no alto das colinas existentes à margem esquerda do rio Tibre. O surgimento de Roma se deu, quando essas aldeias se uniram numa liga de caráter defensino e religioso, denominada "Septimontium'’, criando uma única comunidade, provavelmente em 753 a.C..
Ao se unirem, as aldeias se fortaleceram, prejudicando as comunicações pelo rio Tibre entre as cidades etruscas de Veios e Fidenes, motivo pelo qual os etruscos ocuparam a liga de aldeias, a qual chamaram “Rumon” (Roma), que significa a “cidade do Rio”. Os etruscos aos poucos urbanizaram Roma: houve a abertura de ruas, a instalação do Fórum(centro cívico e mercado0, a construção de casas e de templos e até de uma rede de esgotos.
A econômico baseava-se na exploração da agricultura de cereais e na pecuária. Com o aumento da população, o comércio e o artesanato também se desenvoleram e surgiram classes sociais diferenciadas.
A cidade era dominada por um conjunto de famílias extensas – as “gentes” – que reconheciam ter um antepassado comum, praticavam o culto familiar e detinham as melhores terras agrícolas, formando uma aristocrácia. Os membros das “gentes” eram denominados patrícios, nome derivado de “pater” (pai), o chefe todo poderoso de cada família nobre.
A maioria da população de Roma era formada pela plebe, constituída por pessoas sem organização gentílica, de origem variada e sem direitos políticos. Os plebeus eram geralmente camponeses, artesãos e comerciantes e podiam ser escravizados por dívidas.
Além dos patrícios e dos plebeus, existiam os clientes, plebeus que se colocavam sob a proteção de determinada família patrícia, em troca de sustento e de obediências. A clientela permaneceu como um traço marcante da sociedade romana até o Império e como símbolo do poder das famílias gentílicas.
Do ponto de vista político, Roma era uma monarquia. A assembléia dos cidadãos patrícios em idade militar(comitia curiata) elegia ao rei, que exercia ao mesmo tempo as funções de chefe militar, sumo sacerdote e juíz, com dois atributos especiais: o “imperium”, mando supremo, e o “auspicium”, capacidade de interpretar a vontade dos deus pelo vôo dos pássaros.
Havia também um importante órgão denominado Conselho dos Anciãos ou Senado, composto de 100 chefes das famílias patrícias(mais tarde 300) nomeados pelo rei. O senado podia vetar as decisões do rei sempre que contrariassem as leis tradicionalmente estabelecidas, baseadas nos costumes dos antepassados.
Segundo a tradição, Roma teve sete reis, sendo os três últimos etruscos: Tarquínio Prisco, Sérvio Túlio e Tarquínio, o Soberbo. Em 509 .C.,os patrícios, apoiados pelos plebeus, expulsaram os etruscos e proclamaram a República em Roma.

ROMA, REPÚBLICA ARISTOCRÁTICA (509 a 31 a.C.)

O período republicano em Roma durou de 509 a 31 a.C., e foi marcado pela luta política dos plebeus para conseguirem igualdade de direitos aos patrícios e pela expansão territorial romana, primeiramente na Península Itálica e posteriormente em todo mar Mediterrâneo. As conquistas enriqueceram muitas famílias patrícias e plebéias, consolidando o latifúndio e o trabalho escravo.
Com a proclamação da República, o rei foi substituído por dois cônsules eleitos anualmente pelos patrícios. Os Cônsules eram assessorados por um corpo de magistrados formado por dois pretores(encarregados da justiça), dois edis(encarregados do abastecimento, do policiamento e da urbanização de Roma), oito questores(administradores do tesouro público) e dois censores(encarregados de estabelecer a lista dos cidadãos, dos senadores e da vigilância dos costumes).
A aristocracia patrícia manteve o seu poder através do Senado, que se tornou a principal instituição política da República. O Senado era responsável pela política externa, pelo controle dos magistrados e dos generais em campanha e podia impedir qualquer mudança que fosse contra os interesses dos patrícios. O Senado e os Magistrados possuíam mais poder do que as Assembléias populares.
Os plebeus não tinham acesso a qualquer cargo público. A luta pela igualdade jurídica aos patrícios dominou a política interna de Roma nos séculos V e VI a.C., obrigando os patrícios a fazer concessões que beneficiaram principalmente os plebeus ricos. Assim, em 493 a.C., foi criado o Tribunato da Plebe, constituído por dois tribunos que formava uma magistratura especial, encarregada de defender os direitos dos plebeus; mais tarde, o número de tribunos da Plebe foi aumentado para dez.
Os plebeus reivindicaram também a publicação por escrito das leis, o que resultou na organização de um amplo código, datado de 450 a.C., denominado Lei das Doze Tábuas, abrangendo disposições relativas principalmente ao direito civil dos romanos. Entretanto, o acesso às magistraturas e o casamento com os patrícios continuavam proibidos aos plebeus.
Sob a pressão dos plebeus ricos, novas leis foram criadas. Pela Lei Canuléia de 445 a.C., foi permitido o casamento entre patrícios e plebeus; pela Lei Licínias-Séxtias de 367 a.C., os plebeus tiveram acesso a um dos Consulados; e pela Lei Ogúlnia de 300 a.C., os plebeus puderam desempenhar funções sacerdotais e de Pontífice Máximo. Essa lenta mudança levou os plebeus a participarem do Senado, visto que os Cônsules se tornavam automaticamente membros dele, ao fim do mandato. O resultado foi a formação de uma nova nobreza – a nobilista – composta de ricas famílias patrício-plebéias, consolidando o caráter oligárquico de Roma.

A expansão territorial romana

As lutas políticas internas de Roma ocorriam concomitantemente à sua expansão territorial. A partir do século V a.C., Roma consolidou poder sobre o Lácio e iniciou a conquista e dominação das populações estabelecidas na Península Itálica, em guerras que se estenderam de 498 a 275 a.C.. A boa organização de seu exército em formações denominadas legiões e os eficientes armamentos como catapultas, torres móveis e aríetes garantiam a eficiência e a vitória dos soldados romanos.

CONQUISTAS ROMANAS NA PENÍNSULA ITÁLICA
Submissão dos VOLCOS (488 a.C.);
Século V a.C.
Submissão dos ÉQUOS (457 a.C.).

Tomada de VEIOS, cidade etrusca (386 a.C.):
Século IV a.C.
Submissão da ETRÚRIA (310 a.C.).

Vitória sobre os ETRUSCOS, SAMNITAS, GAULESES (295 a.C.);

Submissão dos GREGOS da MAGNA GRÉCIA (271 a.C.);

Século III a.C. 1ª GUERRA PÚNICA (contra os cartagineses) com a anexação da SICÍLIA (264 / 241 a.C.);

Anexação da CÓRSEGA e SARDENHA (238 a 225 a.C.);

Conquista da GÁLIA CISALPINA (região de Milão, em 225 a.C.).

Com a expansão territorial, as terras confiscadas pelo Estado Romano nas regiões conquistadas, eram transformadas em terras públicas – o ager publicus – que podiam ser arrendadas a cidadãos romanos para exploração da agricultura e do pastoreio. Isso trouxe inúmeros conflitos agrários, girando em torno do direito de posse sobre o “ager publicus”, pois enquanto muitos cidadãos aumentavam suas terras às custas dele, outros se viam limitados a um pequeno lote insuficiente à sobrevivência. As pessoas, que não conseguiam terras, deixavam o campo e iam para as cidades viver como artesãos, pequenos comerciantes ou clientes.
Após a conquista da Península Itálica, os romanos empreenderam uma série espetacular de campanhas militares, que lhes deu a supremacia no mundo mediterrâneo. Essas guerras resultaram numa quantidade enorme de terras e escravos, que beneficiaram principalmente a “nobilitas” romana.
Ao transformarem o Mar Mediterrâneo no “Mare Nostrum”, com a livre navegação por todas as suas margens, os romanos incorporaram de modo diferente as províncias situadas a oeste e a leste de Roma.
A oeste, a Espanha, a Gália e a Bretanha eram regiões habitadas por povos culturalmente atrasados. Em seu interior, Roma implantou o latifúndio com produção agrícola em larga escala, por trabalho escravo. O latim, língua dos antigos habitantes do Lácio, acompanhou o curso das conquistas. Sobrepujando os demais dialetos itálicos, difundiu-se por toda a Península Itálica e espelhou-se pela Europa Ocidental e África do Norte. Cidades foram fundadas para administração e comércio, como Córdova, Lyon, Amiens e outras urbanizadas segundo o padrão romano, com largas avenidas, aquedutos, termas e templos. Entretanto, as províncias ocidentais do império sempre permaneceram menos povoadas e menos desenvolvidas que as do oriente.
No Mediterrâneo Oriental, os romanos conquistaram os grandes Estados helenísticos da Macedônia, Grécia, Síria e Egito, onde procuraram manter a organização social e política já existentes, contentando-se em obter altos rendimentos com a cobrança de impostos. O trabalho escravo foi menos utilizado e não houve processo de romanização como no Ocidente. Aqui é Roma que se deixa influenciar pela riqueza da civilização helenística.


CONQUISTAS ROMANAS FORA NA PENÍNSULA ITÁLICA
SÉCULO MEDITERRÂNEO OCIDENTAL MEDITERRÂNEO ORIENTAL
III a.C. 2ª Guerra Púnica, com a conquista da ESPANHA(218 a 201 a.C.). Conquista do ÉPIRO, na Grécia(275 a.C.);

Ocupação do litoral da ILÍRI, atual Iugoslávia(229/228 a.C.).
II a.C. 3ª Guerra Púnica, com a destruição de CARTAGO, na ÁFRICA(149/146 a.C.); Conquista da MACEDÔNIA(197 a.C.);

Conquista da ÁSIA MENOR(190 a.C.);
Criação da província da GÁLIA NARBONENSE(122 a.C.).


Intervenção romana no EGITO(168 a.C.);

Anexação do reino de PÉRGAMO(129 a.C.);

Criação da província da ÁSIA(126 a.C.).
I a.C. Conquista da GÁLIA TRANSALPINA(51 a.C.); Conquista do PONTO, no Mar Negro(74/64 a.C.);

Anexação da SÍRIA(63 a.C.);

Anexação do EGITO(30 a.C.);

Anexação da ILÍRIA(9 a.C.).
I d.C. Conquista da BRETANHA(68 d.C.). Anexação da JUDÉIA(6 d.C.).
II d.C. Criação da província da ARÁBIA(106 d.C.);

Anexação da DÁCIA(107 d.C.).

As conquistas tornaram Roma fabulosamente rica. Para ela encaminhavam-se as obras de arte da Grécia, os produtos raros do Oriente, os animais e plantas da África, os cereais de todas as províncias, além de filósofos, cientistas e artistas do mundo helênico. Surgiram os arcos de triunfo, para celebrar vitórias de generais e as primeiras basílicas destinadas à administração da justiça, à discussão de negócios e de política. As termas, construções típicas dos romanos, tornaram-se abertas ao público com vestiários, salas de banho frio, morno e quente, bibliotecas, salas de jogos e palestras.

Latifúndio e trabalho escravo

As conquistas romanas, dentro e fora da Península Itálica, pelo largo período que mantinham os pequenos proprietários mobilizados no exército para guerra, provocaram o seu endividamento progressivo, impossibilitando-lhes manter suas terras. Estas passaram a ser incorporadas pelos grandes proprietários(já enriquecidos pela posse do “ager publicos”), fato que ferou uma concentração cada vez maior das terras nas mãos do “nobilistas”. Latifúndio e trabalho escravo tornaram-se, então, a forma dominante da produção romana, principalmente do século II a.C. em diante.
As propriedades rurais romanas – as “villae” – variavam entre 120 e 1 200 hectares e sua área podia ser contínua ou dispersa. Produziam azeite, vinho, cereais, gado, enriquecendo enormemente a oligarquia patrício-plebéia.
Os escravos eram geralmente prisioneiros de guerra, privados de liberdade, que realizavem todo tipo de trabalho no campo e na cidade. Existiam escravos na lavoura, no pastoreio, na administração das propriedades, nas minas, no comércio, no trabalho doméstico, e como escribas, bibliotecários e professores. Alguns gozavam de privilégios por terem uma especialização, como por exemplo, os vinhateiros, os porqueiros, os arrieiros e principalmente o “vilicus”, administrador das terras de um rico senhor, encarregado da organização do “trabalho escravo” na propriedade.
Rebeliões de escravos, como a comandada por Espactacus no século I a.C., foram freqüentes durante a República, exprimindo a revolta dos que eram submetidos à mais alta exploração do trabalho. Por outro lado, muitos escravos ganhavam ou compravam sua liberdade, tornando-se cidadãos com plenos direitos cívicos.
Mesmo sendo a agricultura a principal atividade econômica no mundo romano, as cidades desenvolveram-se bastante: era onde os proprietários residiam e governavam, tornando-se centros manufatureiros e mercantis. As manufaturas existentes nas cidades romanas eram basicamente o trabalho em madeira, couro, metais, cerâmica, tinturaria e materiais de construção.

O Direito Romano

Durante a Realeza ou Monarquia(753 a 509 a.C.), as leis existentes baseavam-se nos costumes dos antepassados e nas decisões do rei, chefe militar, político e religioso. Na época republicana(509 a 27 a.C.), o costume dos antepassados continuou como uma das fontes do Direito. Mas, a esse direito não escrito juntou-se um direito escrito, representado pelas leis, pelos senatus-consultus e pelos editos dos magistrados refletindo a separação entre o poder religioso e o poder político, operado pelo novo regime.
“Aquilo que os sufrágios do povo em último lugar ordenaram é a lei” diz uma passagem da Lei das Doze Tábuas, mostrando que o Direito já não era considerado uma revelação dos deuses aos antepassados e portanto imutável e sagrado. Ao contrário, ele se mostrava agora como algo que pode e deve se modificar, conforme as circunstâncias o exigirem.
Da população das Leis das Doze Tábuas em 450 a.C. ao fim da República, o Direito Romano evoluiu enormente, constituindo a estrutura que acompanhou a conquista do Mediterrâneo, o crescimento das trocas de mercadorias e o uso cada vez mais amplo do trabalho escravo. Desenvolveu-se principalmente o direito civil e comercial que tratava de questões sobre compra, venda, aluguel, arrendamento, herança, seguro, e o direito de família, relacionado com questões matrimoniais e testamentárias. O direito pleno do cidadão à propriedade de bens e escravos ficou claramente regulamentado.
Os jurisconsultos, especialistas que estudavam as leis para interpretá-las convenientemente e torná-las aplicáveis aos casos concretos, tiveram suas atividades multiplicadas. Procuravam sempre resolver os conflitos entre as partes a partir de normas gerais baseadas na eqüidade e no bom senso. Com isso, a ciência do direito, isto é, a Jurisoprudência(de “iuris” = direito e “prudentia” = ciência) evoluiu e o Direito Romano sobreviveu à República e ao Império.

A crise da República oligárquica(século I a.C)

As guerras de conquista, no período republicano, beneficiaram a classe senatorial, detentora de poderes políticos, que acumulou enormes riquezas em tributos, extorsões, terras e escravos. Ao lado dela, cresceu uma classe de homens abastados – os “cavaleiros” – que se enriqueceram nas atividades manufatureiras, comerciais e de empréstimos.
Mas a classe dos pequenos proprietários rurais, que fornecia soldados ao exército, não se beneficiava das conquistas. Ao voltarem para suas terras, depois das batalhas, os agricultores percebiam que não podiam concorrer com o latifúndio escravista e com o trigo barato vindo das províncias, arruinando em larga escala e migrando para as cidades, principalmente Roma.
Todas as tentativas para melhorar a situação dos pequenos proprietários resultaram em fracasso, como a reforma agrária tentada pelos irmãos Tibério e Caio Graco, de 133 a 121 a.C., devido à forte oposição da oligarquia senatorial.
Assim, enquanto o campo cobria-se de grandes propriedades trabalhadas por escravos(estima-se que no final do século II a.C. havia cerca de 2 000 proprietários entre os 400 000 cidadãos romanos), Roma povoava-se de uma classe popular – os “proletarii” – sem terrras e sem trabalho, pois as oficinas artesanais preferiam utilizar o trabalho escravo.
Esse proletariado urbano, composto de artesãos, trabalhadores, pequenos lojistas e escravos libertos habitava em bairros apinhados, ameaçado pela fome e pela pobreza. Tornou-se dependente dos favores do Estado, que para mantê-lo submisso, adotou o costume de distribuir cereais(trigo) gratuitamente. Transformou-se também em massa de manobra de políticos ambiciosos das classes dirigentes(senadores e cavaleiros) que, em troca de seu apoio eleitoral, ofereciam-lhes ingressos para jogos, representações teatrais e festas. Tal política de controle social adotada por Toma, chamada “panem et circenses”(pão e jogos de circo) foi grandemente adotada a partir do século I a.C., mantendo na cidade um proletariado passivo e facilmente manejável pelos políticos.
De 91 a 88 a.C., Roma enfrentou conflitos armados com as províncias situadas na Península Itálica. Aliadas de Roma nas guerras mantidas fora da Itália, seus habitantes exigiram e conseguiram a cidadania romana. Em 88 a.C., começaram as guerras contra o rei Mitrídates, do Ponto(região da Ásia Menor, entre o Mar Negro e o Mar Mediterrâneo), que ameaçavam os domínios romanos na região. Entre 73/71 a.C., foi esmagada uma grave rebelião de escravos comandada por Espartacus, que chegou a reunir 70 000 homens, derrotando várias vezes os exércitos romanos, até ser dominada pelo general Crasso.
Nesse contexto de guerras, cresceu a popularidade dos generais cujas legiões conseguiam vitórias militares, como Pompeu(no Ponto, na Espanha e na África), Crasso(na Itália) e Júlio César(na Gália Transalpina). Os soldados passaram a se tornar mais fiéis aos generais que lhes podiam garantir pilhagens e vantagens nas vitórias do que ao próprio Estado Romano. Em Roma, os líderes dos partidos aristocráticos, assim como os das classes populares, buscavam apoio dos chefes militares nas lutas políticas.
Assim, em 60 a.C., os três generais vitoriosos, Pompeu, Crasso e Júlio César tomaram o poder, formando o 1º Triunvirato. Após a morte de Crasso, seguiu-se um período de guerra civil entre Pompeu e César, culminando com o triunfo deste último, em 46 a.C.. Garantido por suas legiões, César passou a exercer o poder de modo pessoa e autocrático.
Júlio César governou apoiado pelos exércitos, pelos Cavaleiros e pela massa popular, anulando, na prática, o poder do Senado. Controlou as Assembléias e as Magistraturas e introduziu mudanças importantes como a concessão da cidadania romana aos habitantes das províncias no exterior e a fundação de colônias fora da Itália, onde terras foram distribuídas aos veteranos das guerras.
César morreu assassinado em 44 a.C., por membros do Senado insatisfeitos com seu governo. Seguiu-se um novo período de guerras civis, em que o Senado tentou infrutiferamente recuperar o poder. Em 42 a.C. formou-se o 2º Triunvirato, do qual faziam parte os generais Marco Antônio, Lépido e Otávio(filho adotivo de César). Estabeleceu-se que Marco Antônio governaria o Oriente; Lépido, a África e Otávio, o Ocidente; a Itália seria governada pelos três, conjuntamente.
Mais tarde, os Triúnveros desentenderam-se pela conquista da supremacia política. Após outra guerra civil. Otávio, vitorioso, tornou-se dono absoluto do poder, em 31 a.C.. Foi o fim das guerras civis e da República.
Durante o século I a.C., a crise agrária que afetou os pequenos proprietários, os conflitos com as províncias italianas, as revoltas populares urbanas e as guerras civis entre generais romanos romperam o equilíbrio político, social e cultural da República, levando à sua transformação em império centralizado.

Autores: Fábio Costa Pedro e Olga M. A. Fonseca Coulon.
História: Pré-História, Antiguidade e Feudalismo, 1989

A Grécia Antiga



A Grécia Antiga ou Hélade localizava-se na bacia do Mar Egeu, abrangendo o território europeu ao sul da Península Balcânica, as ilhas dos mares Egeu e Jônio e a costa ocidental da Ásia Menor. Daí se espalhou pelas costas dos mares Negro e Mediterrâneo, atingindo o sul da Itália e da França e a costa da Líbia no norte da África, sendo o mar Mediterrâneo sua principal via de comunicação.
A civilização grega ou helênica começou a existir por volta de 1200 a 1100 a.C., com a chegada dos dórios ao sul da Península Balcânica, conquistando os aqueus que aí habitavam.

A GRÉCIA PRÉ-HELÊNICA

Anteriormente à chegada dos dórios, existiram na região da bacia do Mar Egeu duas importantes civilizações: a Cretense, na ilha de Creta e a Aqueana ou Micênica, no continente europeu. Essas civilizações conheciam a escrita, utilizavam armas e instrumentos de bronze e tinham agricultura, artesanato e comércio desenvolvidos. Os cretenses foram dominados pelos aqueus por volta de 1 400 a.C..
Civilização aqueana ou micênica teve como principais centros Micenas, Tirinto e Pilos, na península do Peloponeso, onde foram construídos palácios que eram fortalezas monumentais. A sociedade apresentava-se composta de numerosas famílias principescas, reinando sobre pequenas comunidades agrárias.
Entre 1200 e 1100 a.C., os centros palacianos micênicos foram completamente destruídos pelas invasões dos dórios, povo vindo do norte e de língua indo-européia, assim como os aqueus, porém de índice civilizatório mais baixo. Em compensação, apresentavam uma superioridade: o uso em larga escala de utensílios e armas de ferro, fator incontestável de sua vitória sobre os aqueus, que permaneciam na idade do bronze.
Os dórios moveram-se até o sul do Peloponeso; daí estenderam-se à ilha de Creta e algumas ilhas do Mar Egeu. Com isso, muitos aqueus migraram para as ilhas e a costa ocidental da Ásia Menor, numa região que ficou conhecida como Jônia e Eólia, onde procuraram preservar suas tradições e sua organização de cunho patriarcal, criando pequenos povoados agrícolas.
Com as invasões, o comércio, as comunicações e a arte regrediram e a escrita desapareceu, permanecendo apenas as habilidades técnicas d agricultura, da cerâmica, da metalurgia e a língua grega. Entretanto, com os dórios nascia uma nova cultura e um novo tipo de vida – a civilização helênica ou grega – que iria se expandir atingindo o apogeu no século V a.C..

O PERÍODO HOMÉRICO (SÉCULOS XII O XI a.C.)

Os quatrocentos anos que se seguiram à chegada dos dórios (de 1200 a 800 a.C. aproximadamente) permanecem bastante obscuros para nós, devido à escassez de fontes escritas. O que existe sobre a época são os poemas épicos a “Ilíada” e a “Odisséia” escritos por Homero, provavelmente no século VIII a.C., baseado em poesias e cantos transmitidos oralmente pelos “aedos” (poetas e declamadores ambulantes), entremeando lendas e ocorrências históricas relacionadas com as guerras entre os dórios e os aqueus.

A organização gentílica dos gregos

Os poemas homéricos referem-se aos acontecimentos relacionados à destruição da sociedade micênica, como as guerras de Tebas e de Tróia. Relatam as ações dos heróis gregos, com a ajuda de seus deuses. De sua leitura, percebe-se que a sociedade da época era formada por reis (basileus) e nobres, senhores de terras e rebanhos. Os nobres organizavam-se em famílias extensas – os genói – em que os membros eram unidos por laços de parentesco consanguíneo e/ou religioso.
O “genos” era o núcleo humano em torno do qual se estruturava o “oikos”, unidade econômica que compreendia terras, casas, ferramentas, armas e gado, dos quais dependia a sobrevivência do grupo. O trabalho no “oikos” – pastoreio, agricultura de cereais, legumes e frutas, produção de óleo e vinho, fiação e tecelagem – era realizado pelos membros do “genos” e pelos escravos, obtidos através de pilhagens e saques; tanto quanto possível, o “oikos” procurava ser auto-suficiente.
A principal ocupação dos nobres, chefes dos “oikos”, era a guerra praticada contra os vizinhos ou inimigos externos. As lutas se restringiam ao combate individual entre os guerreiros, pesadamente armados. O objetivo das guerras era essencialmente a aquisição de escravos e de metais que o “oikos” não produzia.
Além dos reis e dos nobres, existiam trabalhadores livres – demiurgos – ferreiros, carpinteiros, videntes e médicos, que prestavam serviços aos nobres e ocasionalmente participavam de suas assembléias, como ouvintes, sem direito a tomar decisões. Abaixo dos demiurgos, havia os tetes, homens sem posses e sem especialização, que vagavam de um lado para outro em troca de algum alimento ou roupa.

O desaparecimento da monarquia

Por volta do século VIII a.C., em algumas regiões do território grego dos Bálcãs, da Ásia Menor e das ilhas do Mar Egeu, já havia um grande número de comunidades dominadas por grupos de famílias aristocráticas proprietárias das melhores terras, que justificavam seu poder pela autoridade que lhes provinha dos antepassados, muitas vezes um “herói” famoso do passado, ou mesmo até um deus. A figura do rei desaparecera, substituída por magistrados eleitos e por conselhos de nobres.
Aos poucos o pequeno povoado tornou-se regra, com a população reunindo-se em volta das antigas fortificações micênicas, onde logo surgiam uma praça para o mercado e um ou dois templos. Esboçava-se assim a forma de vida tradicional dos gregos – a “pólis” – que irá se expandir de forma original durante os séculos seguintes.

O PERÍODO ARCÁICO (SÉCULOS VIII a.C.)

O desenvolvimento da pólis

Nas comunidades da Jônia, na costa ocidental da Ásia Menor, os imigrantes aqueus, estimulados pela localização geográfica que lhes facilitava o contato com outros povos, desenvolveram o comércio, o artesanato e a navegação. Houve também o reaparecimento da escrita, derivada do alfabeto fenício, entre 800 e 750 a.C..
Foi na Jônia que pela primeira vez ocorreu a fusão de várias aldeias em uma só, dando origem à pólis (cidade-estado), num processo denominado sinecismo, que posteriormente se estendeu por outros territórios da Grécia. As póleis eram núcleos urbanos independente e autônomos, de lavradores e proprietários de terras cujos rendimentos provinham principalmente da produção de azeite e vinho.
O território das póleis era reduzido e o solo não muito fértil. Em cada uma havia a Acrópole, colina fortificada e centro religioso; a Ágora, local central onde se situavam os edifícios públicos, o mercado e a praça de reunião dos cidadãos; o porto e o território rural. A população se aglomerava em volta da Acrópole ou se espalhava na área rural, constituindo, entretanto, campo e cidade, uma só unidade.
A organização política das cidades-estado era oligárquica, baseada no domínio da nobreza hereditária sobre o restante da população. Os cidadãos descendentes das famílias gentílicas proprietárias das melhores terras exerciam o poder, como Magistrados e como membros do Conselho de Anciãos e da Assembléia dos Cidadãos, funções e órgãos que existiam em cada cidade e aos quais somente os aristocratas tinham acesso. Aos pequenos proprietários rurais, comerciantes, artesãos, armadores, estrangeiros e escravos não era permitida qualquer atuação nos negócios.
Nas cidades gregas, o trabalho escravo esteve sempre presente, desde os tempos homéricos. Nessa época, os escravos eram estrangeiros adquiridos no mercado ou prisioneiros de guerra. Posteriormente, os pequenos proprietários que se endividavam e não conseguiam saldar seus compromissos, eram transformados em escravos do devedor, bem como toda sua família.
O grande número de cidadãos escravizados e de cidadãos livres que não possuíam terras nem direitos civis trouxe insatisfação e conflitos sociais nas póleis, contribuindo para que o sistema político de muitas delas se modificasse. Assim, os gregos experimentaram em suas cidades diferentes formas de governo, como oligarquia, tirania e democracia, de acordo com a menor ou maior participação dos cidadãos livres nos negócios da pólis, e do menor ou maior poder dos Conselhos de Nobres ou das Assembléias de cidadãos.
Esparta e Atenas representam o tipo clássico de cidades respectivamente oligárquica e democrática. Em Esparta, o poder permaneceu sempre nas mãos dos cidadãos proprietários de terras – os esparcistas. Em Atenas, as lutas políticas levaram à extensão da cidadania a todos os atenienses livres, tornando-se pois democrática, apesar da existência de grande número de escravos estrangeiros. As demais póleis gregas seguiram de perto a organização de Esparta ou de Atenas.

A colonização grega

A pobreza do solo que não produzia alimento suficiente para uma população em crescimento, a escravidão por dívidas e a concentração cada vez maior das terras nas mãos da aristocracia foram fatores que levaram a um amplo movimento migratório dos gregos durante os séculos VIII a VI a.C., em direção aos mares Negro e Mediterrâneo.
Grupos de colonos, com recursos fornecidos pelo governo de suas cidades de origem, partiam em busca de terras cultiváveis, onde fundavam novas póleis, tais quais as existentes no território grego. Assim, as colônias fundadas ao norte, nas costas da Trácia, do mar de Mármara e do mar Negro, e a oeste, nas ilhas do mar Jônio, no sul da Itália e da Sicília (a Magna Grécia), no sul da França e norte da Líbia se constituíram em saída para a crise agrária e foram fator de progresso econômico e cultural.
Os gregos fundaram dois tipos de colônias: de povoamento e de exploração comercial. Nas primeiras, denominadas “apoikias”, como Siracusa, Cirene, Tarento, Bizânico, os cidadãos se estabeleciam definitivamente, construindo cidades com acrópoles, templos e teatros. Independentes e autônomas desde a fundação, as “apoikias” mantinham apenas ligações religosas, culturais e comerciais com as respectivas ‘cidades-mães”.
As colônias de exploração, em menor número, eram chamadas de “emporion” e serviam de entreposto comercial, permitindo o fornecimento de produtos e matérias primas à metrópole. As mais conhecidas foram Náucratis, fundada no delta do rio Nilo, no Egito, e Al Minas, na foz do rio Oronte, na Síria.
A colonização promoveu uma intensa troca de produtos agrícolas, metais e artesanato, trazendo o crescimento das riquezas e das cidades. Das colônias do mar Negro, chegavam à Grécia, o trigo, o peixe, o ouro, as peles e os escravos. Da Magna Grécia, provinham o trigo, o azeite, o vinho, o ferro e o estanho. Em meados do século VI a.C., quando a expansão grega foi interrompida, devido à resistência de fenícios e etruscos que também disputavam o domínio do litoral do mar Mediterrâneo, havia centenas de póleis espalhadas em solo grego e no estrangeiro, todas situadas a menos de 40 quilômetros da costa.
A colonização beneficiou grandes e pequenos proprietários de terra, que dedicavam ao cultivo da vinha e da oliveira, produzindo vinho e azeite para exportação. Favoreceu os proprietários de oficinas artesanais(cerâmica, tecelagem, metalurgia, construção naval), cuja produção cresceu, facilitada pela divisão do uso da moeda. Ampliou a classe dos comerciantes e armadores e incentivou o progresso cultural, sobretudo nas cidades gregas da Ásia Menor.
Em função das transformações econômicas e da expansão da riqueza, os gregos foram abandonando as tradições e o mitos gentílicos e desenvolveram uma mentalidade individualista, racional e criativa, que já transparece claramente ns obras dos cientistas e filósofos jônios do século VI a.C., como Tales, Anaximandro, Anaxágoras, da Escola de Mileto. Criaram a lógica e a matemática, afirmando serem os sentidos e a razão os verdadeiros critérios para a compreensão das leis que regem o universo.
O resultado da nova visão grega de mundo foi um avanço impresssionante do conhecimento humano. Filosofia, literatura, história, geometria, arquitetura, escultura, teatro, leis, oratória, debate, voto, tudo isso desenvolveu-se entre os gregos, de uma forma original e até então nunca alcançada. O sábio Protágoras de Abdera(século V a.C.)expressou o humanismo tipicamente helênico, quando afirmou que o “homem é a medida de todas as coisas”, e a civilização grega comprovou isso.
“(...) os comerciantes(...) não só os das metrópoles, mas também os das colônias, irradiam o Helenismo para além das fronteiras étnicas. Transportam, juntamente com os carregamentos de mercadorias, a poesia, as lendas e a arte da Grécia. Por seu intermédio, os povos bárbaros ligam-se à civilização e os povos civilizados sofrem a influência que os permeia por todos os lados(...).” (GLOTZ, G. História Econômica da Grécia. Lisboa, Ed. Cosmos, p. 122, 1946)

ESPARTA – A PÓLIS OLIGÁRQUICA

A cidade de Esparta(ou Lacedemônia) era formada por cinco aldeias localizadas no vale do rio Eurotas, na região do Peloponeso. Surgiu por volta do século XI a.C., quando os dórios invadiram a região e dominaram a população aquéia, transformando-a em hilotas – escravos do Estado. Os dórios dividiram a terra dos vencidos entre si, cabendo um lote de terra a cada família dórica.
O aumento da população determinou a expansão de Esparta sobre os territórios vizinhos. No fim dos século VIII a.C., os espartanos já haviam conquistado a Lacônia e a Messênia, ao sul do Peloponeso e reduzido também seus habitantes a condição de hilotas.
A sociedade espartana era formada de três classes sociais distintas. A classe dominante era a dos cidadãos, denominados esparciatas, de origem dórica, proprietários de lotes de terra – o Kleros – cultivados pelos hilotas e transmitidos hereditariamente. Os esparciatas dedicavam-se exclusivamente às tarefas públicas e militares.
A última classe era a dos hilotas – servos do Estado. Os hilotas eram descendentes da população nativa dominada: cultivavam o Kleros e realizavam todo tipo de trabalho, sustentando os esparciatas e suas famílias. Diferentemente dos escravos de Atenas, os hilotas não eram estrangeiros comprados no mercado.
A necessidade de manter as populações nativas submetidas transformou Esparta numa sociedade fortemente militarizada, exigindo dos cidadãos espartanos uma disciplina férrea, iniciada desde a infância. Foi em Esparta que o sistema hoplítico de combate, criado pelos gregos, mais se desenvolveu. Por esse sistema, os cidadãos soldados – os hoplitas – combatiam com suas lanças, a pé, em fileiras sucessivas, protegidos por seus escudos, dispensando o uso de cavalos.
A organização política de Esparta era oligárquica, regida por leis não escritas atribuídas ao lendário legislador Licurgo. Havia dois reis, hereditários, com funções religiosas e militares. O poder de fato era exercido pela Gerúsia ou Conselho de Anciãos, órgão composto por 28 cidadãos com mais de 60 anos, inclusive os reis. A esse órgão competia fazer as leis. Os Éforos ou vigilantes, em número de cinco, eram cidadãos eleitos anualmente, com o poder de fiscalizar tudo e todos e de convocar a Assembléia dos cidadãos ou Apela. A Apela, formada pelos esparciatas maiores de 30 anos, elegia os gerontes e os éforos e votava, sem discutir, as propostas dos éforos ou da Gerúsia.
Esparta apresentava um sistema político inteiramente diferente do que Atenas desenvolvia: era uma cidade-estado fechada em si mesma, sob o controle oligárquico de talvez 8 ou 9 mil esparciatas proprietários de terra, com qualidades militares excepcionais. Isso era possível devido ao extenso trabalho dos hilotas, que retirava dos cidadãos qualquer encargo direto com a produção, pemitindo-lhes o tempo necessário para o treinamento para a guerra.

ATENAS: OLIGARQUIA, TIRANIA E DEMOCRACIA ESCRAVISTA

A cidade-estado de Atenas está situada na península da Ática, ocupada pelos jônios desde o século X a.C.. No início do período arcaíco (século VIII a.C.), sua população livre estava assim dividida: os eupátridas, de origem gentílica, grandes proprietários de terras trabalhadas por escravos; os georgói, pequenos proprietários de terras, trabalhadas por eles mesmos; os demiurgos, trabalhadores livres como artesãos, comerciantes, proprietários de pequenas oficinas, médicos, advinhos, professores. As duas últimas classes formavam o “demos”, o povo. Com o desenvolvimento da colonização e das trocas, um grande número de estrangeiros – os metecos – fixou-se em Atenas, dedicando-se principalmente ao comércio.
Nessa época, Atenas constituía uma oligarquia, governada pelos eupátridas, reunidos num conselho de nobre – o Areópado – que escolhia os Magistrados, denominados Arcontes. Os Arcontes, em número de nove, eram eleitos por um período de um ano. O principal era o Arconte-Epônimo, com funções administrativas; o Arconte-Basileu tinha funções religiosas; o Arconte-Polemarco exercia funções militares e os Tesmotetas, em número de seis, cuidavam da Justiça. Os camponeses (georgói), os artesãos (demiurgos), os estrangeiros (metecos) e os escravos não possuíam qualquer poder político.
Em Atenas, assim como nas demais cidades gregas, a base da vida econômica era a terra, que pertencia aos eupátridas e aos georgói, sendo o trabalho escravo muito utilizado, principalmente pelos primeiros. Nos séculos VIII e VII a.C., tornou-se comum a escravização de cidadãos atenienses, geralmente pequenos proprietários que não conseguiam produção suficiente para o sustento familiar e se endividavam em grãos e ferramentas junto às famílias ricas. Progressivamente, os eupátridas aumentavam suas propriedades, incorporando as terras dos devedores que não conseguiam saldar seus compromissos e transformando-os em escravos.
Essa situação trazia grande insatisfação, gerando lutas entre a aristocracia agrária e as classes populares, que se estenderam por todo o século VII a.C. e que resultaram em reformas no governo oligárquico de Atenas.


A NOBREZA E O POVO, DURANTE A ÉPOCA DA OLIGARQUIA, E AS REFORMAS DE SÓLON
“... aconteceu que os nobres e a multidão (povo) entraram em conflito por largo tempo. Com efeito, o regime político era oligárquico em tudo; e, em particular, os pobres, suas mulheres e seus filhos, eram escravos dos ricos. Chamavam-lhes “clientes” ou hectómores (sextanários): porque era com a condição de não guardar para si mais de um sexto da colheita que eles trabalhavam nos domínios dos ricos. Toda a terra estava num pequeno número de mãos; e se eles não pegavam a sua renda (de 5/6 da colheita), podiam ser tornados escravos, eles, suas mulheres e seus filhos; pois todos os empréstimos tinham as pessoas por caução, até Sólon, que foi o primeiro chefe do partido popular... O povo... não possuía nenhum direito... o povo revoltou-se então contra os nobres. Depois de violenta e demorada luta, os dois partidos concordaram em eleger Sólon como árbitro e arconte; confiaram-lhe o encargo de estabelecer uma constituição.
... Sólon libertou o povo... pela proibição de emprestar tomando as pessoas como caução... aboliu as dívidas tanto privadas como públicas...”
(ARISTÓTELES, “A Constituição de Atenas.” In: FREITAS, G. de, op. Cit. p. 67.)

Coube a Sólon, eleito arconte em 594 a.C., redigir novas leis para Atenas. Determinou a libertação dos camponese dos hipotecas e da escravidão por dívidas e proibiu empréstimos sujeitos à escravização do devedor e de sua família. Procurou estabelecer uma relação entre a furtuna do cidadão e seus direitos políticos, dividindo a população de Atenas em quatro classes, segundo o rendimento anual e individual: os pentakosiomedimnói, os hippeis, os zeugitai e os tetes. Assim, privou a aristocracia no monopólio dos cargos públicos, pois às duas primeiras classes foi permitido o acesso às magistraturas mais altas; à terceira, o acesso às magistraturas mais baixas e à quarta e última, um voto na Assembléia Popular ou Eclésia, órgão de representação dos cidadãos. Sólon critou também o Conselho dos Quatrocentos – a Bulé – composto de cidadãos maiores de 30 anos, à razão de 100 por cada uma das quatro tribos jônicas tradicionais de Atenas.
As reformas de Sólon diziam respeito exclusivamente aos cidadãos nascidos em Atenas, excluindo os comerciantes estrangeiros (metecos), os demais escravos existentes e as mulheres. Além disso, não rompeu com o poder exercido pela aristocracia, visto que não houve uma melhor distribuição das terras. Por outro lado, a proibição da escravização de atenienses intensificou a utilização do escravo-mercadoria obtido no comércio com os bárbaros, nas guerras entre as cidades ou através de pirataria.

A Tirania

A persistência das lutas entre os aristocratas e os setores populares, que incluíam também os comerciantes e armadores enriquecidos com a agro-exportação, fez surgir em Atenas a figura do tirano, líder político que tomava o poder apoiado pelas massas. Durante o século VI a.C., outras cidades conheceram também a tirania. Os tiranos eram geralmente originários do grupo de novos proprietários de terra, porém sem origem gentílica. Foram importantes porque introduziram reformas na legislação agrária em benefício das classes populares e inovaram na arte militar. Com eles, o direito à cidadania foi ampliado, as leis deixaram de ser privilégio da aristocracia e foram publicadas.
O tirano ateniense Psístrato (560/527 a.C.) procurou regulamentar definitivamente a questão agrária, distribuindo aos camponeses as terras confiscadas aos nobres; assim, o regime de pequena propriedade impôs-se em toda a Ática. Psístrato proporcionou emprego aos artesãos e aos trabalhadores urbanos, através de um programa de construção de obras públicas como templos, estradas, fortificações e portos; forneceu também assistência financeira direta aos camponeses, sob a forma de empréstimos. Em seu governo, Atenas transformou-se no maior centro urbano do mundo helênico. Com sua morte, em 527 a.C., o poder passou às mãos de seu filho Hípias, que governou até 510 a.C., quando foi deposto por uma revolução. Terminou, assim, a época da tirania, em Atenas.
Na Grécia, as tiranias foram fases decisivas no processo de transição do poder oligárquico da nobreza para a cidade-estado clássica, do século V a.C.. Significaram o fim da dominação das póleis pelas famílias gentílicas, permitindo a evolução para a democracia.

A Democracia

Com a deposição de Hípias, último tirano de Atenas, resurgiram as lutas políticas, por um breve período. Em 508 a.C., com forte apoio popular, Clístenes assumiu o governo, estabelecendo a democracia.
Clístenes dividiu a população de Atenas em 160 demói (circunscrições administrativas), espalhadas por 30 tritias e 10 tribos (circunscrições eleitorais). Cada tribo continha três tritias: uma do litoral, uma da área urbana e outra da área rural. Assim, cada tribo era composta por grandes e pequenos proprietários, mercadores, artesãos e marinheiros, acabando por completo com o predomínio das grandes famílias gentílicas.
A reforma de Clístenes instituiu também a votação secreta para o Conselho ou Bulé. Essa teve o número de conselheiros aumentado para 500 (50 por tribo), com funções de controlar as magistraturas e preparar os projetos de lei a serem submetidos à Assembléia Popular ou Eclésia, que se transformou no órgão mais importante de Atenas.
No decorrer do século V a.C., a democracia ateniense foi sendo aperfeiçoado, através de diversas medidas que ampliaram cada vez mais os direitos dos cidadãos livres, maiores de 18 anos, filhos de pai ateniense. Camponeses e artesãos tranformaram-se, assim, em cidadãos plenos, independentemente de suas posses. Entre as inovações, houve a criação dos estrategos, magistrados militares encarregados dos assuntos militares, à razão de um por tribo, e a instituição do “ostracismo” – expulsão, com cassação dos direitos políticos por dez anos, do cidadão denunciado como prejudicial à pólis, pela Assembléia Popular.
Entretanto, a democracia pressupunha a existência do escravo – mercadoria, em número cada vez maior, sendo Atenas a cidade onde a escravidão mais se expandiu. Do ponto de vista do grego, a cidadania não podia existir sem a sujeição de outros. O trabalho escravo propiciava ao cidadão o tempo livre para os serviços da pólis e para a vida intelectual, favorecendo o florescimento da civilização.
Enquanto os trabalhadores livres eram mais numerosos nas atividades de subsistência, na pequena produção mercantil e no comércio varejista, os escravos predominavam na produção em larga escala, no campo e na cidade, nas minas e nos serviços domésticos. Assim, coexistiam o trabalho livre e o trabalho escravo.
Havia também escravos alugados exercendo funções de porteiros, pedagogos, cozinheiros, amas, sendo que seus donos recebiam-lhes o salário; escravos que trabalhavam pagando a seus senhores quotas fixas ou parte dos ganhos; escravos do Estado, utilizados na pavimentação de ruas, na fabricação de moedas, como guardas, etc.
Os principais mercados de escravos no mundo grego eram as cidades de Bizâncio, Atenas, Éfeso, Corinto, Egina, Tanais, Quios e Delos. Por serem de origem muito diversificada, as revoltas de escravos foram muito raras. A alforria (liberdade) podia ser alcançada e o liberto era considerado da mesma categoria social que os metecos (estrangeiros residentes em Atenas). Liberdade e escravidão estiveram estreitamente ligadas no mundo helênico.

OS ESCRAVOS – “...As propriedades são uma reunião de instrumentos e o escravo é uma propriedade instrumental animada... Se cada instrumento pudesse executar por si próprio a vontade ou o pensamento do dono..., ... se (por exemplo) o arco pudesse tirar sozinho da cítara os sons desejados, os arquitetos não teriam necessidade de operários, nem os senhores teriam necessidade de escravo...
Todos aqueles que nada têm de melhor para nos oferecer que o uso do seu corpo e dos seus membros são condenados pela natureza à escravidão. É melhor para eles servir que serem abandonados a si próprios. Numa palavra, é naturalmente escravo quem tem tão pouca alma e tão poucos meios que deve resolver-se a depender de outrem.. O uso dos escravos e dos animais é aproximadamente o mesmo...”
(ARISTÓTELES, “Política”, in: FREITAS, G. de, op. Cit., p. 70.)

O PERÍODO CLÁSSICO (SÉCULOS V E IV a. C.)

As guerras greco-pérsicas e o imperialismo ateniense

No início do século V a.C., os gregos tiveram que enfrentar a ameaça dos persas, cujo Império chegou a abranger a Lídia, as cidades gregas da Ásia Menor, o Egito, a Trácia e a Macedônia, controlando importantes regiões fornecedoras de trigo. Em 492 a.C., os persas atacaram diretamente a Grécia continental, tendo sido derrotados pelos atenienses nas batalhas de Maratona (490 a.C.), provando a superioridade da forma hoplítica de combate. Numa outra investida, os persas foram novamente derrotados por Atenas na batalha naval de Salamina (480 a.C.), e na batalha de Platéia pelas forças coligadas de Atenas e Esparta.
Para defender as póleis do mar Egeu e da Ásia Menor de possíveis novas invasões persas, Atenas organizou uma liga de cidades sob sua liderança, denominada Liga de Delos (477 a.C.). Todas as cidades – membros contribuíram com homens, navios e dinheiro, para o tesouro da Liga, localizada na ilha de Delos. Mesmo quando o perigo dos ataques persas diminuiu, Atenas não permitiu que qualquer cidade se retirasse da Liga, tornando-se, assim, uma cidade imperialista. O símbolo da transformação foi a mudança da sede e do tesouro da Liga de Delos para Atenas, em 454 a.C., sendo seus recursos utilizados na reconstrução e embelezamento da cidade e na melhoria do nível de vida de sua população.

A democracia escravista na época de Péricles (460/429 a.C.)

Durante o governo de Péricles, que exerceu o cargo de principal estratego por 30 anos, Atenas atingiu o apogeu de sua vida política e cultural, tornando-se a cidade-estado mais proeminente da Grécia.
A prosperidade econômica de Atenas baseava-se na prata extraída dos Montes Láurion, nas contribuições cobradas aos membros da Liga de Delos e no trabalho escravo, utilizado em quantidade cada vez maior. Os escravos eram empregados nos serviços públicos e domésticos, nas oficinas artesanais, no campo e na mineração, exercendo todas as atividades que o grego considerava degradante para o cidadão.
A participação direta dos cidadãos na Assembléia Popular era a chave da democracia ateniense: não existiam representação, partidos políticos organizados nem funcionalismo burocrático. No governo de Péricles, instituiu-se a remuneração para todos os cargos e funções públicas, permitindo que o cidadão pobre pudesse participar da política sem perda de seus meios de manutenção; restringiu-se o pode da Bulé e criou-se a “ação de ilegalidade”, isto é, o cidadão responsável por uma lei, que após um ano de aplicação se mostrasse nociva à cidade, era passível de punição, de multas.
Os cidadãos do sexo masculino maiores de 18 anos podiam assistir aos discursos da Eclésia e neles intervir, sempre que quisessem, assim como propor emendas, votar questões sobre a guerra, a paz, a regulamentação dos cultos, o recrutamento de tropas, o financiamento de obras públicas, as negociações diplomáticas, etc. Diretamente da Assembléia Popular, os atenienses debatiam e decidiam os destinos da pólis. Excluídos da democracia, estavam os escravos, os estrangeiros e as mulheres.
A direção da Assembléia Popular ou Eclésia, a participação na Bulé, nas Magistraturas e no Tribunal Popular denominado Heliase eram determinadas por sorteio e com duração limitada. As reuniões da Eclésia eram realizadas na Ágora e ocorriam pelo menos quatro vezes em cada 36 dias. Os cidadãos que possuíam o dom da oratória, associado ao conhecimento dos negócios públicos e ao raciocínio rápido, conseguiam impor seus pontos de vista. O voto era aberto, pelo levantamento das mãos.

“NOSSA CONSTITUIÇÃO política não segue as leis de outras cidades, antes lhes serve de exemplo. Nosso governo se chama DEMOCRACIA, porque a administração serve aos interesses da maioria e não, de uma minoria.
De acordo com nossas leis, somos todos iguais no que se refere aos negócios privados. Quanto à participação na vida pública, porém, cada qual obtém a consideração de acordo com seus méritos, e mais importante é o valor pessoal, que a classe à que se pertence isso quer dizer que ninguém sente o obstáculo de sua pobreza ou da condição social inferior quando seu valor o capacite a prestar serviços à cidade(...) Por essas razões e muitas mais ainda, nossa cidade é digna de admiração.
(Trechos do Discurso de Péricles. Citado por AQUINO, R. & Outros, op. cit. p.201.)

A democracia e o crescimento econômico transformaram Atenas no centro da civilização grega. No espaço de dois séculos, produziu ou atraiu um grande número de filósofos, cientistas, artistas e escritores, valorizando a medida humana da cultura grega.
Às concepções filosóficas lançadas pelos pensadores gregos do século VI a.C., como Anaxágoras, Pitágoras, Heráclito, Parmênides e Zenon, acrescentaram-se os conhecimentos científicos dos filósofos dos séculos V e IV a.C., que constituíram a base do pensamento das sociedades ocidentais. Na filosofia, destacaram-se Sócrates, Platão e Aristóteles. Na literatura, surgiram autores de peças teatrais que apresentaram a condição humana explorada no íntimo de seu ser e exposta com força grandiosa. Sobressaíram-se, no drama, Ésquilo (Os Persas, Prometeu Acorrentado, Sófocles (Édipo Rei, Antígona) e Eurípedes (Medéia, Troianos); na comédia, Aristófanes (As Rãs, As Núvens, A Paz); na História, Heródoto, Xenofonte e Tucídides. Na Medicina, foi muito importante Hipócrates, de Quios e na Física, Demócrito.
Os gregos salientaram-se também na escultura e na arquitetura, de linhas sóbrias e harmoniosas. Templos, teatros de arena e outros edifícios públicos foram construídos em todas as cidades gregas, destacando-se o Partenon, templo dedicado à deusa Palas Atena, na Acrópole de Atenas, ornamentado pelo escultor Fídias.
De tal maneira foi importante e universal a cultura grega, que sobre ela assim se expressou o orador ateniense Isócrates: “De tal modo a nossa cidade se distanciou dos outros homens, no que toca ao pensamento e à palavra, que os seus alunos se tornaram mestres dos outros e o nome de Gregos já não parece ser usado para designar uma raça, mas uma mentalidade, e chamam-se Helenos mais os que participam da nossa cultura do que os que ascendem a uma origem comum.” (ISÓCRATES, Panegírico, citado por FREITAS, G. de, op. cit. p. 78.)

A Guerra do Peloponeso e o declínio das póleis gregas

A rivalidade econômica e política entre Atenas e Esparta e as cidades aliadas desencadeou a guerra do Peloponeso (431/403 a.C.0, trazendo destruição, conflitos sociais e empobrecimento das póleis. Em Atenas, a guerra prolongada arruinou os pequenos camponeses que foram obrigados a abandonar suas terras e a se refugiar na área urbana. A vitória de Esparta trouxe a instalação de oligarquias em toda a Grécia.
Terminada a Guerra do Peloponeso, o período entre 403 e 362 a.C. foi marcado pela hegemonia de Esparta, seguida pela supremacia de Tebas. O desgaste das cidades com o longo período de guerras facilitou a conquista da Grécia por Felipe da Macedônia em 338 a.C., na batalha de Queronéia. Felipe foi sucedido por seu filho Alexandre (336/323 a.C.), que fundou o Império Macedônico, englobando a Grécia, a Pérsia, a Mesopotâmia e o Egito. Chegava ao fim o mis brilhante período da Grécia antiga.
Passando a integrar o Império de Alexandre, os quadros políticos, econômico e social da Grécia foram completamente alterados. Entretanto, a cultura grega, sob o domínio da Macedônia e, mais tarde, de Roma, difundiu-se por terras distantes, aproximando-se das culturas do Oriente, o que deu origem ao período helenístico.

CONCLUSÃO

Deve-se ressaltar eu a organização política oligárquica ou democrática das cidades gregas encontrava-se num nível inteiramente novo e diferente de tudo o que já ocorrera nas civilizações antigas. Principalmente nas póleis que conheceram alguma forma de tirania, os gregos conseguiram o equilíbrio possível entre grupos sociais antagônicos. Cidadãos de diferentes níveis de riqueza e ocupação, como grandes e pequenos proprietários, camponeses, donos de oficinas, artesãos, armadores, artistas, marinheiros participavam da vida da pólis e influenciavam a formação dos governos. Com isso, os gregos descobriram a idéia de liberdade, distinta do poder pessoal dos reis ou do privilégio de famílias aristocráticas.

O Antigo Egito


LOCALIZAÇÃO


O Egito está situado no nordeste da África, entre os desertos de Saara e da Núbia. É cortado pelo rio Nilo no sentido sul-norte, formando duas regiões distintas: o Vale, estreita faixa de terra cultivável, apertada entre desertos, denominada Alto Egito; o Delta, em forma de leque, com maior extensão de terras aráveis, pastos e pântanos, denominado Baixo Egito.

A FORMAÇÃO DO ESTADO EGÍPCIO (5000/3000 a.C.)

Por volta do quinto milênio antes de Cristo, com o progressivo ressecamento do Saara, bandos de caçadores e coletores de alimentos se fixaram às margens do Nilo. Iniciaram o cultivo de plantas (trigo, cevada, linho) e a domesticação de animais (bois, porcos e carneiros), favorecidos pelas inundações notavelmente regulares e ricas em húmus do rio.
Os grupos humanos constituíam-se em clãs, que adotavam um animal ou uma planta como entidade protetora – o Tótem. A cerca de 4 000 a. C., as aldeias de agricultores passaram a se agrupar, visando a um melhor aproveitamento das águas do rio, formando os “nomos”, primeiras aglomerações urbanas. Desenvolveu-se um trabalho coletivo de construção de reservatórios de água, canais de irrigação e secamento de pântanos. A agricultura passou a gerar excedentes, utilizados nas trocas entre os nomos. Os egípicios aproveitavam também a riqueza mineral da região, extraindo granito, basalto e pedra calcárea das montanhas que margeiam o vale.
Os nomos eram independentes entre si e dirigidos pelos nomarcas que exerciam ao mesmo tempo a função de rei, juiz e chefe militar. Gradualmente, os nomos foram se reunindo em dois reinos, um no Delta, Baixo Egito, e outro no Vale, Alto Egito, que mais tarde irão constituir um só Império. Nesse período anterior à unificação, os egípicios já haviam criado a escrita hierográfica e um calendário solar, baseado no aparecimento da estrela Sírius, dividido em 12 meses de 30 dias cada, mais cinco no final do ano.
Os antigos habitantes atribuíam a unificação do país, que ocorreu por volta de 3 000 a.C., a um personagem lendário, Menés, rei do Baixo Egito, que teria conquistado o Alto Egito e formado um só reino com capital em Mênfis. Segundo a crença, o responsável pela unificação era considerado sobre-humano, verdadeiro deus a reinar sobre o Alto e o Baixo Egito e o primeiro “faraó” (rei-deus egípicio).
Ora, isso não pode ser comprovado arqueologicamente. A unificação decorreu da necessidade de uma direção centralizada para o melhor controle das enchentes do rio, que tanto podiam trazer a fartura das colheitas, como a destruição das aldeias e das plantações. De todo modo, a crença serviu para divinizar os governanes que se utilizaram muito bem dela para se impor à população e manter um domínio direto sobre todas as terras do Egito.

PERÍODOS DATAS APROXIMADAS DINASTIAS
Idade Neolítica 5 000 a 3 000 a.C. Pré-dipástico
Império Tinita
Capital: Tinis 3 000 a 2 778 a.C. I – II
Antigo Império
Capital: Mênfis 2 778 a 2 263 a.C. III – VI
1º Período Intermediário 2 263 a 2 040 a.C. VII – X
Médio Império
Capital: Tebas 2 040 a 1 680 a.C. XI – XIV
2º Período Intermediário 1 680 a 1 580 a.C. XV – XVII
Novo Império
Capital: Tebas 1 580 a 1085 a.C. XVIII – XX
Baixa Época
(reis líbios, reis etíopes, renascimento saíta e domínio persa) 1 085 a 332 a.C. XXI – XXX
Época Grega
Capital: Alexandria 332 a 30 a.C. Ptolomeus
ARTES NOS SÉCULOS. SP., Ed. Abril Cultural, 1969, v. l, p. 56

Recebendo impostos e serviços dos camponeses ds aldeias, que cultivavam as terras, os faraós acumularam grande soma de poder e de riqueza.

O PERÍODO DINÁSTICO

Com a unificação dos nomos em um único Estado, iniciou-se o período dinástico da história do Egito, que se divide em três eras principais – o Antigo Império, o Médio Império e o Novo Império – separados por períodos intermediários em que a autoridade faraônica decaiu, trazendo anarquia e descentralização.

O Antigo Império, entre 2 700 e 2 200 a.C., foi a época em que o poder absoluto dos faraós atingiu o auge, principalmente durante a IV Dinastia, dos faraós Quéops, Quéfren e Miquerinos, que mandaram construir as enormes pirâmides (sepulcros) da planície de Gizé, perto da capital, Mênfis.

O Médio Império, com capital em Tebas, aproximadamente de 2 000 a. C., a 1 700 a.C., foi uma época de expansão territorial, de progressos técnicos nos canais de irrigação e de exploração de minérios na região do Sinai. A mando do faraó Amenemá I, da XII Dinastia, foi construída uma grande represa para armazenamento das águas, que ficou conhecida como lago Méris ou Faium.
No período intermediário que se seguiu, houve aumento do poderdos “nomarcas”, rebelião de camponeses e escravos e ocupação do Delta pelos hicsos, povo de origem asiática, iniciando um período que durou cerca de um século e meio.

O Novo Império começa com a expulsão dos hicsos por volta de 1 580 a.C., e marcou o ponto culminante do país como potência política. Os faraós dos Novo Império, destacando-se Tutmés II e Ramsés II, deram início a uma política externa expansionista, com a conquista da Núbia (ao sul), da Síria, da Fenícia e da Palestina, formando um Império que chegava até o Eufrates.
Seguiu-se um período denominado Baixo Império, de sucessivas invasões por povos estrangeiros: assírios (671 a.c.), persas (525 a.C.), macedônios (332 a.C.) e romanos (30 a.C.) que liquidaram o Império Egípicio, uma civilização que perdurou por cesa de 35 séculos (3 500 anos).

O RIO NILO E A ECONOMIA DO EGITO ANTIGO

O rio Nilo exerceu importância fundamental na economia do Egito, oferecendo água e terra cultivável a uma região situada em pleno deserto. Mas era preciso utilizar a inundação, distribuir a água equitativamente, aumentar a superfície irrigada e drenar pântanos. Isso foi feito a partir dos nomos, num trabalho coletivo que envolvia a população de várias aldeias.
O grande rio fornecia a alimentação, a maior parte da riqueza e determinava a distribuição do trabalho das massas camponesas nas aldeias. Durante a Inundação (jul /out), com os campos alagados, os homens transportavam pedras para as obras de construção dos faraós, escavavam poços e trabalhavam nas atividades artesanais. Na Vazante (nov / fev), com o reaparecimento da terra cultivável, captavam as águas e semeavam. Com a Estiagem (mar / jun), colhiam e debulhavam os cereais. A alimentação era complementada pela pesca e pela caça realizada nos pântanos do delta do Nilo. A agricultura produzia cevada, trigo, legumes, frutas, uvas e linho.
As atividades artesanais, de artigos destinados ao consumo da população, eram realizadas nas oficinas das aldeias. Desenvolviam-se em função das matérias primas e dos produtos agrícolas oferecidos pelo rio: tijolos e vasilhames fabricados com a argila úmida das margens; vinho, pão, cerveja e objetos de couro; fiação e tecelagem do linho; utilização do papiro para a produção de cordas, redes, papel e barcos. O Delta era o principal centro pecuário e vinícola.
O artesanato de luxo, de consumo da aristocracia, de alta especialização e qualificação excepcional – ouriversaria, metalurgia, fabricação de vasos de pedra dura ou de alabastro, faiança, móveis, tecidos finos – concentravam-se em oficinas mais importantes, pertencentes ao faraó e ao templos. A cidade de Mênfis possuía a melhor metalurgia.
Os funcionários do Faraó eram responsáveis pela circulação dos produtos entre as diversas regiões do país e pela organização do trabalho de mineração e das pedreiras, exploradas através de expedições ocasionais.
O pequeno comércio local trocava produto por produto; em transações maiores usavam-se pesos de metal. O grande comércio externo, por terra ou por mar, era realizado com as ilhas de Creta e Chipre, com a Fenícia e com a costa da Somália, para a importação de madeira para a construção naval, prata, estanho, cerâmica de luxo, lápis-lazúli. Organizava-se através de grandes expedições ordenadas pelo Faraó, mobilizando mercadores, funcionários e soldados.
O Faraó, através de seus funcionários, controlava diretamente todas as atividades econômicas, proprietário que era das terras do Egito: planejava as obras de irrigação, a construção de tempos, pirâmides e palácios; fiscalizava a produção agrícola e artesanal; organizava o comércio e a exploração das minas; distribuía o excedente; cobra os impostos dos camponeses, usados para sustentar o Estado. O Palácio e o tempo dos deuses eram o centro da acumulação da riqueza.

A MONARQUIA EGÍPICIA: O FARAÓ E SEU POVO

A sociedade do Egito Antigo encontrava-se dominada pelo FARAÓ e por uma aristocracia hereditária, formada pela família real, pelos altos sacerdotes, funcionários e chefes militares. Constituíam a parte menor da população total do Egito.
O Faraó, cujo poder sem limites possuía uma forte base religosa, era o intermediário necessário entre seu povo e os deuses. Considerado o proprietário de todo o Egito, suas funções consistiam em assegurar a ordem interna, dirigir a economia, defender o país e cuidar da religião.
Os altos sacerdotes dedicavam todo seu tempo ao serviço pessoal dos deuses; acumulavam grandes riquezas pelas doações reais e pela administração dos bens do tempo; desfrutavam de privilégios, como a isenção de impostos, graças à importância da religião para os antigos egípicios.
Dentre os mais altos cargos do governo, estavam o de vizir (primeiro ministro), o de tesoureiro-chefe, o de chefe da coleta de impostos, o de ministro das obras públicas e de comandante do exército. Todos esses altos funcionários prestavam obediências ao Faraó. Também se destacavam os Nomarcar – governadores dos nomos – escolhidos pelo Faraó dentre os descendentes dos clãs mais importantes.
Numa situação social intermediária, encontravam-se os numerosos escribas e funcionários inferiores (encarregados dos registros contábeis e administrativos, da arrecadação de impostos, da fiscalização das obras públicas e do recenseamento da população), os sacerdotes de baixa hierarquia (astrólogos, leitores de livros sagrados, cantores, músicos, portadores de objetos sagrados e inspetores dos artistas do tempo), além de artífices e artistas especializados que estavam a serviço do Faraó e dos templos.
A vasta maioria da população era formada pelas massas que trabalhavam nas oficinas artesanais, nos campos e nas minas. Desenhistas, pedreiros, carpinteiros, escultores, pintores, tecelões, joalheiros e armeiros eram recrutados pelo Faraó, nobres e altos sacerdotes, para o trabalho em seus palácios, templos e oficinas reais. Recebiam, pagamento em ração: pão, cerveja, cebola, carne seca, gordura e sal.
Os camponeses ou felás, analfabetos, eram servos que trabalhavam as terras do Faraó, dos templos, dos altos funcionários e das aldeias. Forneciam ao Estado rendimentos enormes, sob a forma de impostos “in natura” sobre suas safras e rebanhos, ficando apenas com uma pequena parte do que produziam. Na época d cheia, eram chamados a trabalhar compulsoriamente na construção de palácios, templos túmulos e nas obras de irrigação. Eram também recrutados para servir no exército, se necessário.
Abaixo dos camponeses, havia um pequeno número de escravos, geralmente prisioneiros de guerra, forçados a trabalhar nas minas de ouro e cobre da Núbia, do Sudão e do Sinais. Os mais afortunados eram designados para o serviço doméstico da família real e da nobreza.
Os trabalhadores eram mantidos na submissão pela vigilância, pela repressão e por um conformismo baseado na crença do caráter divino da monarquia. Os que se negavam a cooperar eram impedidos de chegar às fontes de água ou de terem os seus campos irrigados, através do corte da água.
O Estado egípcio era assim uma monarquia despótica, em que o Faraó, com poderes ilimitados, era considerado um deus. Para governar, apoiava-se num grupo privilegiado de aristocratas (altos funcionários), sacerdotes e militares) que administravam o país. Os camponeses e artesãos estavam submetidos pelo Estado a um trabalho compulsório nos campos, nas oficinas, nas mins e nas obras públicas, caracterizando a chamada “servidão coletiva”.















A RELIGIÃO EGÍPCIA

a. Origens e características:

As raízes da religião egípcia encontra-se nas aldeias neolíticas, anteriores à organização do Estado. Como a maioria dos povos primitivos, os primeiros egípcios tinham uma atitude de respeito em relação ao fenômenos da natureza – o Sol, a Lua, o Nilo – e às características marcantes dos animais – a ferocidade do leão, a força do crocodilo, etc. As primeiras divindades que surgiram eram quase sempre representadas sob a forma de um animal. Os egípcios veneravam especialmente o Sol: devem ter percebido que a vida depende dele e o adoravam sob vários nomes e diversos cultos. À medida em que foram aprendendo a dominar a natureza, passaram a valorizar as qualidades humanas e o antropomorfismo – concepção dos deuses sob a forma humana - apareceu na religião egípcia, algum tempo antes do advento da primeira dinastia.
Os egípcios eram politeístas. Cada nomo possuía o seu próprio deus, “senhor do lugar”, freqüentemente associado a um animal, enfeixando atribuições e poderes diferentes. Apenas as cerimônias do culto, executadas pelos altos sacerdotes, eram semelhantes para os diversos deuses. Quando uma cidade se tornava importante politicamente, o deus local tendia a aumentar de prestígio e o seu culto crescia. Assim ocorreu com o deus Ra de Heliópolis, o Ptah de Mênfis, o Hórus-Falcão do Delta, o Amon-Ra de Tebas, o Ibis-Tot de Hermópolis.
A religião influenciava profundamente a vida dos egípcios. Consideravam que os menores detalhes de seu quotidiano e tudo que os cercava – das cheias previsíveis do Nilo à morte acidental de um animal – dependia inteiramente da disposição dos deuses.

b. Principais crenças

Entre as principais crenças religiosas egípcias, sobressaiu-se a do deus Sol, que foi durante vinte séculos o culto oficial da monarquia faraônica. Ao lado dele, os mitos mais importantes foram os de Osíris, Ísis e Hórus, favoritos da devoção popular. Os cultos do Sol e das demais divindades estavam vinculados à importância da agricultura e das cheias do Nilo, das quais dependia a vida das aldeias.
O culto solar, elaborado em Heliópolis (“Cidade do Sol”), reconhecia o Sol – denominado Ra – como divindade suprema e criadora do Universo. Era chamado também de Kopri (sol da manhã), e de Atum (sol da tarde). Esse culto fundiu-se com o de Amon de Tebas, daí Amon-Ra.

HINO AO DEUS RÁ (O SOL): “Que belo é teu levantares-te no horizonte do céu, ó Rá (Sol), iniciador da vida! Quando te arredondas no horizonte, enches a terra de tuas belezas: és encantador, sublime. Quando repousas no horizonte ocidental, a Terra fica em trevas, como morta... Mas a aurora vem, tu despontas no horizonte, irradias como Disco do dia, as trevas dissipam-se... As Duas-Terras do Egito põem-se em festa... Todos os animais se alegram, as árvores e plantas crescem, as aves voam de seus ninhos, com as asas abertas em adoração do teu Ka... Tu criaste a Terra segundo o teu coração, com os homens e os animais, tudo que na Terra existe..., os países estrangeiros..., a terra do Egito... Tu crias o Nilo no mundo inferior e os fazes sair à superfície da terra, onde queres, para alimentar os homens do Egito... e também puseste o Nilo no Céu, para que desça aos povos afastados, para regar seus campos, suas regiões, de que eles vivam...”
(Texto do 2º milênio a. C., in A. Moret, “O Nilo e a Civilização Egípcia”, citado por: FREITAS, G. de. 900 Textos e documentos de História. Antiguidade e Idade Média. Lisboa, Plátano, 1975, v. l, p. 78.
















O MITO DE OSÍRIS: O deus Osíris era um grande rei, que sucedera a seu pai Geb (a Terra); de parceria com sua mulher; a deusa-mágica Ísis, ensinou aos homens a agricultura, inventou o pão, o vinho e a cerveja (elementos essenciais da alimentação do povo egípcio), revelou-lhes a metalurgia. Mas seu irmão Tifão ou Sete mata-o: afoga-o no Nilo, corta-o em pedaços, que espalha pelos canaviais. Então Ísis procura, recolhe e reúne os membros esparsos refaz o corpo (como múmia) e, usando da sua ciência mágica, ressucita Osíris, que viverá agora eternamente, mas no Céu. Vingando-o, seu filho, o deus Hórus, combate e vence Sete e sucede ao pai no trono do Egito. Dele recebem em herança este reino os reis humanos – os faraós – que assim têm caráter divino.

A SIGNIFICAÇÃO DO MITO OSIRIANO: Este mito, não só procura explicar a ascendência divina dos faraós, como, sobretudo, exprime no drama de Osíris, ao mesmo tempo deus da vegetação e divinização do Nilo, o mistério do nascimento das plantas e seus frutos, e depois o da sua morte, quando, na mesma ocasião em que a cheia do Nilo acaba, o vento ardente do deserto (Sete ou Tifão) sopra, e as espigas de trigo ceifadas são batidas, para se separar o grão, de que uma parte, pela sementeira, volta à terra sua sepultura, quando o rio tiver outra vez fecundado o solo (tiver também ressuscitado), para renascer em novas espigas...
(FREITAS, G. de., op. cit. V. 1, p. 47/48)

A lenda de Osíris, que conta a morte e ressurreição do deus, está intimamente ligada à vida política e sócio-econômica do Egito. Através dela, podemos obter dados sobre a unificação do Sul e do Norte, o plantio do trigo, a importância do Nilo e a origem do poder divino do Faraó.
O Faraó era a encarnação do deus e o sumo sacerdote, sendo o seu poder praticamente absoluto, porque exercido em nome do deus. Daí o Egito ser considerado uma monarquia despótica de origem divina.

c. Os templos, as cerimônias do culto e os túmulos

O templo egípcio, construído em pedra, não era um lugar à disposição do povo. Era a habitação privativa da divindade, ao qual somente o Faraó e os sacerdotes tinham acesso.
O culto diário consistia em preces, gestos consagrados, hinos e defumações de incenso, realizados pelos sacerdotes, como delegados do Faraó, em teoria o único habilitado a estabelecer a ligação entre os homens e os deuses. Pela manhã e à tarde, a porta do santuário localizada no interior do templo era aberta e a estátua do deus era reverenciada, lavada e vestida, recebendo oferendas de alimentos e bebidas. Em todos os santuários eram feitos os mesmos atos. Ao povo somente era permitido fazer suas oferendas e adorações na parte externa dos templos.
As crenças sobre a vida depois da morte fizeram dos túmulos egípcios, principalmente as pirâmides, túmulos dos faraós, os mais ricos da história humana em oferendas enterradas com os defuntos e em pinturas retratando a vida quotidiana. A crença na ressurreição do corpo conservado gerou a prática da mumificação por processos muito desenvolvidos e até hoje não inteiramente conhecidos.

O EMBALSAMENTO DE RICO: “Primeiro, com a ajuda de um ferro curvo, extraem o cérebro pelas narinas... Em seguida, com uma pedra cortante, fazem uma incisão no flanco e retiram os intestinos, que limpam e purificam com vinho de palmeira e purificam uma segunda vez com arômatas moídas. Depois, enchem o ventre de mirra pura triturada, de canela e de todos os outros arômatas, com exceção do incenso e cosem. Feito isso, salgam o corpo cobrindo-o de natrão (carbonato de sódio natural) durante 70 dias... Lavam o corpo, enrolam-o todo em faixas de linho fino, com uma camada de borracha (como cola)... Metem o morto num estojo de madeira em forma de figura humana... que guardam no interior de uma câmara funerária...”

O EMBALSAMENTO DE POBRE: “Desinfetam os intestinos... metem-no no sal durante 70 dias; entregam o corpo.” (Heródoto, “Histórias”, in: FREITAS, G. de, 900 Textos e Documentos de História. Lisboa, Plátano, 1975, v. 1, p. 49.

Enormes recursos e trabalhadores foram recrutados no Egito, na construção de templos e pirâmides para perpetuar os Faraós, suas realizações e feitos, mesmo que isso significasse o trabalho compulsório de grande parte da população, não beneficiária desses momentos. A cada ano, os sacerdotes realizavam cerimônias para garantir a chegada da inundação, e o rei agradecia a colheita solenemente às divindades adequadas. Os deuses eram consultados para solucionar problemas políticos e burocráticos, bem como os de caráter familiar. A religião penetrava, pois, em todos os aspectos da vida pública e privada dos antigos egípcios, tornando-se a base do poder do Faraó (“Senhor da Casa Grande”) e marcando profundamente a sociedade, a política, a economia, a medicina, as letras e as artes.

ESCRITA, LITERATURA, CIÊNCIAS E ARQUITETURA


A escrita hieroglífica, inventada em fins do período pré-dinástico e aperfeiçoada sob as primeiras dinastias, foi utilizada até o fim da Antiguidade. Consistia numa combinação de ideogramas (sinais que representam idéias) e fonogramas (sinais que representam sons). Deu origem a duas outras escritas mais simplificadas e mais próprias a serem grafadas no papiro: o hierático e o demótico. A escrita hierogrífica foi decifrada pelo francês Champollion, em 1822.
Os textos egípcios que se conservaram são predominantes religiosos e funerários – textos das pirâmides, textos dos sarcófagos, “Livro dos Mortos” (coletânea de ensinamentos de como proceder na vida de além-túmulo e durante o julgamento de Osíris), hinos a diversas divindades, inscrições que se referem aos mitos e rituais divinos, além de romances, poesias líricas, sátiras, tratados técnicos, etc.
A ciência egípcia consistia em conhecimentos práticos diversos como receitas de medicamentos, fórmulas geométricas e trigonométricas para a agrimensura ou para a construção. A numeração era decimal, mas não usavam o zero; conheciam a soma e a subtração. O calendário, ao mesmo tempo solar e lunar, estabeleceu-se cedo, através da observação da coincidência eventual do aparecimento conjunto do sol e da estrela Sírius. Os médicos egípcios eram famosos na Antiguidade e a prática da mumificação levou a uma acumulação de conhecimentos sobre anatomia. Não obstante, a medicina, a astronomia e os outros ramos da ciência estavam profundamente penetrados de magia e de religião.
A arte egípcia preocupou-se em expressar a riqueza e o poder dos governantes, destacando-se a arquitetura monumental, a decoração de templos e túmulos com relevos, pinturas e estátuas, a confecção de vasos de pedra e a ourivesaria.
A arquitetura era sólida, de proporções colossais, tentando expressar toda a força e poder da monarquia. Os exemplos mais conhecidos são as pirâmides (características do Antigo Império), destacando-se as dos faraós Quéops, Quéfren e Miquerinos; a Esfíngie, gigantesca estátua com corpo de leão e cabeça humana, cuja construção é atribuída a Quéfren; os templos de Luxor e de Carnac, erguidos no Novo Império. Além das pirâmides, a arquitetura funerária criou outros tipos de túmulos: as mastabas, de forma trapezoidal e os hipogeus, tumbas subterrâneas cavadas nas montanhas.

A Mesopotâmia


AS SOCIEDADES DA MESOPOTÂMIA

CARACTERÍSTICAS GEOGRÁFICAS

A Mesopotâmia, “terra entre rios”, é a região da Ásia banhada pelos rios Tigre e Eufrates, que correm no sentido norte-sul, formando uma extensa planície de 140 000 quilômetros quadrados, com solos favoráveis à agricultura e à fixação do homem.
O sul da Mesopotâmia, onde os rios desaguam no Golfo Pérsico, era conhecido como Suméria e suas principais cidades foram: Ur, Larsa, Eridu e Lagash. O centro, correspondendo ao curso médio dos rios, era chamado de Acádia, sobressaindo as cidades de Babilônia, Uruc, Nipur, Sipar e Acad. O norte era denominado Assíria, destacando-se as cidades de Nínive, Nimrud e Assur.

A REVOLUÇÃO URBANA: DA ALDEIA À CIDADE

Os primitivos habitantes da Mesopotâmia viviam em aldeias isoladas de agricultores e pastores. Faziam instrumentos de pedra e vasos de argila; suas edificações eram moradias e templo de adobe, devido à escassez de pedra na região. Aproveitando os diques naturais, formados pelo Eufrates ao sul, praticavam uma agricultura rudimentar, favorecida pela fertilidade trazida pelas inundações periódicas do rio.
Por volta de 3 500 a.C., vindos provavelmente da Ásia Central, os sumérios fixaram-se na Baixa Mesopotâmia, fundindo-se étnica e culturalmente com a população local. Com a sua chegada, deu-se o aperfeiçoamento dos métodos de cultivo e de irrigação. A agricultura, além de abastecer regularmente a população, passou a gerar excedentes para o comércio. Desenvolveram-se o artesanato especializado, o uso de metais e surgiram inovações técnicas como a roda.
A população expandiu-se, dando origem a novos grupos sociais como sacerdotes, funcionários, mercadores, artesãos e soldados. Assim, as aldeias transformaram-se em cidades, como Ur, Uruk, Lagash, com governo próprio e profissões variadas. Estabeleceu-se ativo comércio entre as cidades de Suméria e seus vizinhos. Caravanas de mercadores levavam cargas de cevada e tecidos para a Ásia Menor e para o Irã, retornando com madeira, pedra e metais, que eram transformados em instrumentos, armas e jóias.
A revolução urbana fez surgir na Suméria e posteriormente em Acade, cerca de 15 ou 20 cidades-Estado politicamente independentes, mas com língua, religião, organização social e sistema econômico semelhantes.

O TEMPLO E OS SACERDOTES

O centro de cada cidade da Mesopotâmia era dominado pelo “temenos”, conjunto de templos, destacando-se o “zigurat” ou torre de degraus com um pequeno santuário no alto da elevação.
O templo era dedicado ao culto e às oferendas ao deus, geralmente uma personificação de forças mágicas que permitiam o nascimento da vegetação, a semeadura, a colheita e a sobrevivência do homem. Embora cada cidade possuísse seu próprio deus, havia entre os sumérios algumas divindades aceitas por todos, como Anu, deus do céu; Enlil, da terra; Ea, do oceano e várias divindades menores.
O deus encontrava representantes e intérpretes terrestre – os sacerdotes – cuja origem ligava-se aos mágicos e aos feiticeiros das aldeias neolíticas. Os sacerdotes, a serviço do deus e intérprete da vontade divina para o povo, estavam livres dos trabalhos nos campos e encarregavam-se de administrar e ampliar o tesouro do deus.
Aos sacerdotes do templo cabia também a tarefa de controlar as terras circunvizinhas e dirigir os trabalhos de construção de canais de irrigação, reservatórios e diques. Tinha a seu serviço artesãos especializados, como construtores, pintores, ourives, escultores, carpinteiros e escribas.
O templo era o centro da vida religiosa da cidade e o centro da acumulação de riqueza. O deus, através dos sacerdotes, emprestava aos camponeses animais, sementes, arados e arrendava os campos. Ao pagar o “empréstimo”, o devedor acrescentava a ele uma “oferenda” de agradecimento.
Da necessidade de registrar os bens doados aos deuses e prestar contas da administração das riquezas do templo teve início o sistema de contagem e a escrita cuneiforme, visto que os sacerdotes já não podiam, para as suas transações, confiar apenas na memória ou recorrer ao simples expediente de contar fazendo nós em um lenço.

A FORMAÇÃO DA MONARQUIA

As cidades-Estado da Baixa Mesopotâmia necessitavam do controle das águas dos rios Tigre e Eufrates e da importação de madeira, cobre, estanho e pedras preciosas para sobreviver. Por isso, surgiram disputas entre elas pela demarcação dos limites, pelo direito às águas e pelo acesso às fontes de matérias primas.
Essas disputas tornaram-se constantes, transformando-se muitas vezes em guerras. Nesses períodos, havia a necessidade de se escolher um cidadão capaz e destemido, para guiar os habitantes da cidade à vitória. Sim, por volta de 3 000 a.C., passou a existir o rei, denominado “grande homem” ou “lugal”, com função basicamente militar. Com a continuidade das guerras, a função de rei deixou de ser temporária, tornando-se vitalícia, hereditária e despótica.
A guerra tinha incentivos econômicos, como a conquista de campos cultivados, despojos em alimentos, armas, matérias primas e suprimento de mão-de-obra escrava. Formaram-se bem treinados exércitos, com soldados protegendo a cidade, seus canais e áreas agrícolas contra os ataques de vizinhos e tribos nômades das estepes próximas. Aos poucos, as cidades começaram a disputar entre si a hegemonia da região, dando origem a vários impérios.

O IMPÉRIO ACADIANO

Coube a Sargão I, rei de Acad, estabelecer o primeiro Império na Mesopotâmia, por volta de 2 470 a.C. Em seu governo, pela primeira vez as cidades-estado perderam sua autonomia e passaram a integrar o Império Acadiano, que se manteve por um bom período. O feito de Sargão I foi posteriormente imitado, com maior ou menor êxito, pelos reis de Ur e de outras cidades.

PERÍODOS DATAS APROXIMADAS
Civilização Pré-Sumérica 5 000 a 2 800 a.C.
Primeira Hegemonia Sumérica 2 800 a 2 470 a.C.
Império Acadiano
Invasão dos gutos 2 470 a 2 285 a.C.
2 285 a 2 150 a.C.
Nova Hegemonia Sumérica
Dinastias locais de Isin e Larsn 2 150 a 2 016 a.C.
2 016 a 1 894 a.C.
Primeiro Império Babilônico
Dinastias Gassitas e elamitas 1 894 a 1 595 a.C.
1 595 a 1 100 a.C.
Império Assírio 1 100 a 612 a.C.
Novo Império Babilônico 612 a 539 a.C.
ARTES NOS SÉCULOS. SP., Ed. Abril, 1969, v.1, p.104


O IMPÉRIO BABILÔNICO

Aproximadamente em 1 894 a.C., Hamurabi, rei da cidade da Babilônia, fundiu novamente todas as cidades da Mesopotâmia num só Império, sob sua autoridade, formando o primeiro Império Babilônico, que durou até cerca de 1 595 a. C.
Hamurabi promoveu a unificação administrativa do Império Babilônico usando para isso uma nova legislação – o Código de Hamurabi – atingindo todo o reino. Seus artigos regulamentavam toda a vida da comunidade: a divisão em classes sociais, o comércio, os juros, o casamento, a herança, etc. O direito penal repousava na lei de talião: “olho por olho, dente por dente”, variando as punições de acordo com a classe social do acusado.

“Se um homem roubou o tesouro do deus ou do palácio, este homem é passível de morte e aquele que recebeu o objeto roubado também é passível de morte.

Se um homem furar o olho de um homem livre, furar-se-lhe-á um olho.

Se ele fura o olho de um escravo alheio ou quebra um membro ao escravo alheio, deverá pagar a metade de seu preço.

Se um arquiteto constrói uma casa para alguém, porém não a faz sólida, resultando daí que a casa venha a ruir e matar o proprietário, este arquiteto é passível de morte.

Se ao desmoronar, ela mata o filho do proprietário, matar-se-á o filho deste arquiteto.” (Citado por AQUINO, R. & Outros. História das sociedades. Das Comunidades Primitivas às Sociedades Medievais. Rio de Janeiro, Ao Livro Técnico S/A, 1982, p.114)

Um baixo-relevo em basalto, encontrado em 1901, mostrava Hamurabi recebendo o código de leis do deus-sol Shamash, o que comprova a crença do povo em sua origem divina. Com a ascensão da cidade da Babilônia a capital de um vasto império unificado, Marduk, seu deus local, tornou-se supremo, submetendo Enlil, o deus sumério e os demais deuses. Assim, Hamurabi conseguiu também a unidade religiosa.
O aperfeiçoamento e a unificação dos canais de irrigação, que controlavam as águas dos rios Tigre e Eufrates, possibilitaram um intercâmbio fluvial intenso entre as cidades, favorecendo o desenvolvimento comercial.
Com o crescente desenvolvimento econômico da Babilônia, suas classes sociais ficaram assim definidas: logo abaixo do rei, situavam-se os sacerdotes e as sacerdotisas que desempenhavam funções religiosas, os altos funcionários e os grandes senhores de terras. Seguiam-se os comerciantes, os escribas e os artesãos especializados que constituiam a maior parte dos cidadãos livres. Abaixo estavam camponeses, pastores, pescadores e artesãos, semi-livres, diretamente subordinados ao rei, seguidos pelos escravos (devedores ou prisioneiros de guerra).
As revoltas internas e as sucessivas invasões estrangeiras (elamitas e cassitas) desorganizaram a vida econômica do Império Babilônico; à ruína dos camponeses somou-se a destruição das redes de canais, conseqüência dessas lutas, enfraquecendo o Estado na época dos sucessores de Hamurabi. Esses estrangeiros permaneceram na região até cerca de 1 100 a.C., quando os assírios do norte da Mesopotâmia, os subjugaram, iniciando a formação do Império Assírio.




O IMPÉRIO ASSÍRIO

Os assírios eram agricultores e pastores. Chamavam seu país de Assur, que também era o nome do deus local e de sua principal cidade, localizada às margens do rio Tigre. A região possuía riquezas minerais como o cobre e o ferro, além de madeira e pedra.
A vida urbana desenvolveu-se com a conquista da região por Sargão I, durante o Império Acadiano, por volta de 2 500 a.C. Foi nessa época que os assírios conheceram a metalurgia e a escrita cuneiforme. Posteriormente, a Assíria permaneceu por longo período dominada pelo Império Babilônico.
Os reis eram representantes do deus Assur e exerciam atividades militares no comando dos exércitos. A partir do século VIII a.C., os assírios iniciaram um movimento de expansão territorial sobre as cidades vizinhas. No século VII a.C., sob o reinado de Assurbanípal, o Império Assírio atingiu sua máxima extensão, englobando praticamente todo o Oriente Próximo: do Golfo Pérsico até a Ásia Menor e o Egito.
Devido às guerras de conquistas, cresceu a importância do exército e dos chefes militares, que se tornaram grandes proprietários de terras e de escravos (prisioneiros de guerra). Juntamente com os sacerdotes, gozavam de imensos privilégios, como a isenção de impostos. A massa da população era formada por camponeses e artesãos, obrigada ao pagamento de impostos e à prestação de serviços ao Estado, como a construção de estradas, palácios e templos.
Após a morte de Assurbanípal, começou o enfraquecimento do Império Assírio. Os países subjugados deixaram de pagar os tributos; sucederam-se revoltas internas e invasões de nômades da Ásia Central. O predomínio assírio termina em 612 a.C., com a tomada de Nínive pelos reis da Média e da Babilônia.
Com a queda de Nínive, a cidade da Babilônia tornou a projetar-se, formando o SEGUNDO IMPÉRIO BABILÔNICO. Abriu-se uma época de desenvolvimento cultural e comercial para a Babilônia, que terminou em 539 a.C. com a ocupação da Mesopotâmia pelos persas.

AS ARTES E A CIÊNCIA

A escrita cuneiforme dos sumérios foi empregada em toda a Mesopotâmia, na Síria, na Palestina, na Ásia Menor e no Irã. Assim como no Egito, apenas uma minoria (os sacerdotes e os escribas) sabia ler e escrever; dominar a escrita significativa, pois, uma forma de poder. A a massa da população era analfabeta.
Na arquitetura destacaram-se os zigurates, torres de vários andares, dispondo de rampas inclinadas que ligavam as plataformas. No alto, erguia-se o templo da divindade local. Construíram-se também palácios, templos e fortificações, ornados com esculturas em baixo-relevo.
Utilizando como observatório as torres dos templos, os babilônios desenvolveram a Astronomia: determinaram os movimentos dos planetas e das estrelas e criaram um aperfeiçoado calendário. Desenvolveram também a Astrologia, originando os signos do Zodíaco. Na Matemática, inventaram o sistema sexagesimal e um sistema de pesos e medidas que permitia calcular o comprimento, a superfície e o volume dos corpos. Fizeram também progressos na Medicina, descrevendo numerosas moléstias e os remédios a serem aplicados.
Quando um templo era demolido, enchia-se de tijolos e construía-se o que lhe sucedia sobre essas fundações. Desta maneira, o templo permanecia de pé, consagrado ao deus até a eternidade.

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

A Aldeia Neolítica


AS COMUNIDADES PRIMITIVAS.

Os homens de Cro-Magnon viviam ao ar livre, em bandos nômades. Desde cedo aprenderam a cooperar uns com os outros, para obter o alimento necessário. Distinguiam-se de seus antecessores por seu aspecto físico e por serem caçadores especializados, que faziam armas de pedra, marfim e osso.

Através de golpes no sílex (rocha dura), produziam lâminas ou lascas estreitas, a partir das quais surgiam facas, pontas de projéteis montáveis em cabo, raspadoras que possibilitavam a produção de lanças, arpões, dardos, bastões perfurados para trabalhar o couro, perfuradores e agulhas para costurar roupas.

Praticavam uma economia coletora de subsistência: dependiam da caça, da pesca e da coleta, pois ainda não haviam aprendido a produzir os alimentos. Realizavam caçadas às manadas de mamutes, renas, bisões, bois e cavalos selvagens. Colhiam tudo que lhes pudesse servir de alimento: sementes, nozes, castanhas, frutos, raízes, mel, insetos, ovos, moluscos e pequenos animais.

Havia uma rudimentar divisão do trabalho segundo o sexo: tarefas que cabiam ao homem, à mulher, à criança, ao velho. A liderança natural do bando era exercida pelo mais forte. O conhecimento e as experiências adquiridas eram transmitidos coletivamente e incorporados à tradição comunitária, como, por exemplo, as melhores estações de caça, a distinção entre plantas comestíveis e venenosas, a escolha das melhores pedras para se fazer ferramenta e a observação das fases da lua.

As cavernas naturais e as habitações rudes feitas de galhos de árvores constituíam as mroadias dos homens do Paleolítico. Cada um deles possuía apenas os seus utensílios e ferramentas de uso pessoal. As florestas, os lagos e os rios eram usados e usufruídos coletivamente pelo grupo, que vivia em regime de comunidade primitiva. Nômades, os bandos de homens primitivos mudavam de região constantemente, impelidos pelas variações climáticas ou à procura de novas áreas de caça e de rios mais piscosos.

Dentre suas práticas espirituais, destacavam-se os ritos funerários, nos quais os mortos eram enterrados com seus adornos e utensílios, e os ritos mágicos destinados a assegurar o abastecimento de alimentos e de caça. Para isso, faziam pinturas nas paredes das cavernas, representando animais como mamutes, bisões ou renas. Executavam também esculturas em pedra de figuras femininas, com significativas deformações: seios grandes e enormes ventres, que simbolizavam a fertilidade, a fecundidade e a abundância.

O fim das glaciações permitiu o aparecimento de novos tipos de comunidades, em regiões como o Oriente Próximo e o Oriente Médio. Trabalhando com a natureza, ao invés de somente explorá-la, essas comunidades concretizaram a chamada "revolução agrícola" do período Neolítico.

AS ALDEIAS DE AGRICULTORES E PASTORES

A passagem do Paleolítico para o Neolítico se deu aproximadamente entre 10 000 e 8 000 a.C., com o fim das glaciações. A vida nômade baseada na caça, na pesca e na coleta de alimentos foi, aos poucos, substituída por uma nova sociedade em que o homem praticava a agricultura, domesticava os animais, desenvolvia a cerâmica e a tecelagem, usava ferramentas especializadas de pedra afiada e polida e vivia em aldeias.

Adquirindo maio domínio sobre a natureza e melhor conhecimento das leis de sua reprodução, o homem adquiriu um controle sobre as fontes de alimentação, aumentando, assim o número de pessoas que podia viver numa mesma área. Tudo isso caracterizou uma verdadeira revolução na vida do homem - a revolução agrícola.

O APARECIMENTO DA AGRICULTURA

Os primeiros estágios da agricultura iniciaram-se quando os homens, pela observação, passaram a compreender cada vez mais a respeito das plantas e dos animais que usavam como alimento. Verificaram que ao caírem as sementes no chão, nasciam e cresciam as plantas. Gradualmente, tornaram-se experientes no cultivo do trigo, da cevada, de tubérculos, de frutas e hortaliças, e hábeis em semear, ceifar, armazenar e moer.
Provavelmente, foi domesticando os filhotes dos animais que haviam matado, que os homens aprenderam a criá-los. Passaram a ter rebanhos de bois, carneiro, cabras, porcos, utilizando suas peles, carne e leite. A abundância de lã e de linho tornou possível a tecelagem.

Da observação da terra endurecida ao redor do fogo, nasceu a cerâmica e a olaria. Potes, vasos e outros recipientes passaram a ser largamente utilizados para armazenar a água e os alimentos e para cozinhá-los. Ornamentados, esses objetos tornaram-se importante manifestação da arte neolítica.

A agricultura era praticada de forma bastante rudimentar, exaurindo rapidamente o solo e obrigando os homens a constantes mudanças. Estes estavam agora organizados em tribos, vivendo em cabanas de madeira e barro, que formavam as aldeias.

A ALDEIA NEOLÍTICA

Os arqueólogos acreditam que os primeiros agricultores e pastores viveram por volta de 8 000 a.C., nos vales aluvionais do Oriente Próximo. Por volta de 6 000 a.C., as comunidades agrícolas haviam se propagado através de todo o sudoeste da Ásia e sul da Europa, espalhando-se também pelo norte da África. Pesquisas arqueológicas encontraram restos de antigas aldeias em Jericó na Palestina, em Qalat-Jarno na bacia do rio Tigre e em Tell-Hassuna no Iraque.

Com a agricultura, a terra das aldeias se tornou de uso comum dos clãs e era lavrada coletivamente, assim como os rebanhos, os celeiros, as pastagens e as cabanas. De uso individual permaneceram os apetrechos de caça, os utensílios de cozinha e o vestuário. Tudo aquilo que se produzia era partilhado equitativamente dentro de cada grupo, havendo trocas entre as aldeias apenas em ocasiões especiais, tais como casamentos ou funerais.

Mesmo sendo ainda de subsistência, existia agora uma economia produtora de alimentos e não mais apenas coletora.

O trabalho tornou-se então uma atividade constante e coletiva, que mobilizava toda a aldeia: era preciso drenar pântanos, controlar as enchentes dos rios, limpar florestas, semear os campos, pastorear o gado etc. A divisão do trabalho estava diretamente relacionada com o sexo: as mulheres deviam arar o solo, moer e cozinhar os grãos, fiar, tecer, fabricar os potes e os ornamentos; a limpeza do terreno para o cultivo, a construção das habitações, a criação do gado, a pesca e o fabrico de ferramentas e armas eram as tarefas masculinas.

Os aldeamentos eram formados de habitações pequenas, circulares ou quadradas e sempre de material precário, diferindo conforme a região. Próximo às florestas, erguiam-se cabanas construídas de troncos, próprias das comunidades de caçadores e pastores. Sobre as águas dos lagos e rios, elevavam-se as palafitas dos pescadores.

Durante o período Neolítico, foram edificados os monumentos "megalíticos"(mega = grande; ithos = pedra), entre os quais se destacam os menires (enormes pedras de até 23 metros de altura, encravadas verticalmente no solo) e os dólmens (duas ou mais pedras fincadas no chão, cobertas por outras em posição horizontal, formando uma espécie de mesa). Esses monumentos provavelmente serviam de culto aos mortos ou para cerimônias em honra às forças da natureza.

A aldeia neolítica era auto-suficiente com a população se ocupando em atividades agrícolas, de pastoreio, de tecelagem e na produção de utensílios de cerâmica, de armas e de ferramentas de pedra polida, utilizados na própria aldeia. Sua economia era pouco diversificada e suas técnicas, rudimentares. AS

PRÁTICAS ESPIRITUAIS

A grande dependência que os homens do Neolítico tinham da natureza e os precários conhecimentos sobre a agricultura, o pastoreio e a reprodução deram origem a crenças e ritos mágico-religiosos, que aparentemente tinham o poder de garantir as colheitas e as caçadas abundantes. Ninguém do grupo podia desrespeitá-los, sob pena de severas punições, pois ir contra os "misteriosos" poderes que controlavam a fertilidade do solo e a procriação das mulheres e dos animais significava colocar em risco a sobrevivência de toda a comunidade.

Alguns clãs e tribos se diziam descendentes de determinados animais ou vegetais, que eram venerados pelo grupo caracterizando o fenômeno do totemismo. O tótem podia ser uma ave, um peixe, uma planta ou outro elemento da natureza; era considerado sagrado e símbolo do grupo. As cerimônias rituais e mágicas eram exercidas por "feiticeiros" que os membros da aldeia julgavam possuir poderes originais e que passavam a desempenhar também atividades de chefia e liderança.

Por volta de 4 000 a. C., principalmente nos vales dos grandes rios como o Nilo, o Tigre, o Eufrates, o Indo e o Ganges, os homens tiveram necessidade de se organizar melhor, a fim de obter uma maior produtividade agrícola. Desenvolveram técnicas de irrigação e criaram ferramentas de bronze, utilizando o cobre e o estanho, mais eficazes para o trabalho.

A agricultura passou a gerar excedentes, permitindo a sua troca por matérias primas indispensáveis. A população aumentou; agora, um maior número de indivíduos podia viver numa mesma área dedicando-se a outras atividades que não o plantio e o pastoreio. Assim, as aldeias neolíticas transformaram-se em cidades, com profissões, classes e governo.

Autores: Fábio Costa Pedro e Olga M. A. Fonseca Coulon.
História: Pré-História, Antiguidade e Feudalismo, 1989